Sunday, July 18, 2010

SE ALGUÉM ME DER UM CÃO RAIVOSO DE PRESENTE



"MORITZ

É o melhor. - Eu não me adapto a isto. Que eles se esfolem uns aos outros... Fecho a porta atrás de mim e liberto-me disto tudo. - Não estou muito interessado em me deixar empurrar.
Eu não me impus. Para que é que eu agora me hei-de impor? - Não tenho nenhum contrato com Nosso Senhor. Que vejam a coisa de uma maneira ou de outra, dá sempre o mesmo. Esmagaram-me. - Não responsabilizo os meus pais. De qualquer modo eles deviam estar preparados para o pior. Tinham idade suficiente para saberem o que estavam a fazer. Eu era um bebé quando vim ao mundo. - Senão teria sido suficientemente esperto para me transformar noutra pessoa. - Mas porque é que eu tenho de pagar pelo facto de todos os outros já cá estarem?!
Eu devia ser parvo... se alguém me der um cão raivoso de presente, eu devolvo-lhe o cão raivoso. E se ele não quiser ficar com o cão raivoso, então nesse caso eu sou humano e...
Eu devia ser parvo!
As pessoas nascem totalmente por acaso e não haviam elas de terem reflectido bem - é de dar um tiro na cabeça!"


Frank Wedekind, O Despertar da Primavera, trad. Maria Adélia Silva Melo, 3ª ed., Lisboa: Editorial Estampa, pp. 109-110.

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