Saturday, February 28, 2009

A FRESCO

"O homem é feito de um pouco de lama e água. Porque não havia uma mulher de ser feita de orvalho, vapores terrestres e raios de luz, partículas de arco-íris condensadas? Onde o possível? Onde o impossível?..."


Jacques Cazotte, O Diabo Enamorado, trad. Manuel João Gomes. Lisboa: Vega, 1991, p. 78.

Thursday, February 26, 2009

CREPÚSCULO/QUARESMA



"Así vaga sombra de luz y de nieblas,
mística y aérea dudosa visión,
ya brilla, o la esconden las densas tinieblas
cual dulce esperanza, cual vana ilusión."


José de Espronceda, El Estudiante de Salamanca, 23ª ed. Madrid: Cátedra, 2005, p. 61.

Friday, February 20, 2009

DEUSES ANTIGOS 2


"Este túmulo não tem dentro um cadáver.
Este cadáver, aqui fora, não tem túmulo:
é, ao mesmo tempo, o morto e o túmulo."


Anónimo, in do mundo grego outro sol, selecç. e trad. Albano Martins. Porto: Edições Asa, 2001 p. 311.

Saturday, February 14, 2009

DEUSES ANTIGOS 1



"Serons-nous plus tard semblables à ces cratères où les vulcans ne viennent plus et où l'herbe jaunit sur sa tige?"


René Char, Fureur et mystère, Paris: Gallimard, 2006, p. 120.

Monday, February 9, 2009

PARA QUE SERVEM POETAS EM TEMPO DE INDIGÊNCIA?


"Mas nós, amigo, chegamos demasiado tarde. Certo é que os deuses vivem,
Mas acima de nós, lá em cima, noutro mundo.
Aí o seu domínio é infinito e parecem não se importar
Se estamos vivos, tanto nos querem poupar.
Pois nem sempre pode um frágil vaso contê-los,
O homem apenas algum tempo suporta a plenitude divina.
Depois toda a nossa vida é sonhar com eles. Mas os erros,
Tal como o sono, ajudam, e a necessidade e a noite fortalecem,
Até que haja suficientes heróis, criados em berço de bronze,
De coração corajoso, como dantes, semelhantes aos Celestiais.
Depois eles chegam, trovejantes. Entretanto penso por vezes
Que é melhor dormir do que estar assim sem companheiros,
Nem sei perseverar assim, nem que fazer entretanto,
Nem que dizer, pois para que servem poetas em tempo de indigência?
Mas eles são, dizes, como sacerdotes santos do deus do vinho,
Que em noite santa vagueavam de terra em terra."


Friedrich Hölderlin, "O Pão e o Vinho", in Elegias, trad. Maria Teresa Dias Furtado. Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, 7: p. 75.

Sunday, February 8, 2009

ARGUMENTO ORNITOLÓGICO



"Fecho os olhos e vejo um bando de pássaros. A visão dura um segundo ou talvez menos; não sei quantos pássaros vi. Era definido ou indefinido o seu número? O problema envolve a existência de Deus. Se Deus existe, o número é definido, porque Deus sabe quantos pássaros eu vi. Se Deus não existe, o número é indefinido, porque ninguém pode fazer a conta. Nesse caso, vi menos de dez pássaros (digamos) e mais de um, mas não vi nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três ou dois pássaros. Vi um número entre dez e um, que não é nove, oito, sete, seis, cinco, etc. Esse número inteiro é inconcebível; ergo, Deus existe.


Jorge Luis Borges, "O Fazedor", in Obras Completas, vol. II, Lisboa: Teorema, 1998, p. 161.

Friday, February 6, 2009

O PROJECTO DE SILÊNCIO DOS DEUSES

(Alte Museum, Berlim)

"Dividido o projecto pelos deuses,
cabe ao suporte refazer o mundo
nas projecções da alma e do teorema.
Eles conduzem o tratado, eles
operam no destino, por objecto
que a vida circunscreve a cada lapso.
Recupera-se a luz constantemente,
e a frase ocupa dois momentos só:
entre a resolução de nada e a
periferia de qualquer silêncio."


Luís Adriano Carlos, Invenção do Problema, 2ª edição, Quasi Edições: Vila Nova de Famalicão, 2006. p. 33.