Saturday, April 30, 2011

CHI


"O Universo é infinita solidão,
Onde a sombra fantástica do ser
Divaga, numa eterna exaltação.
A vida é dor. Sofrer é conhecer.
Só os olhos que choram, sabem ver.
A lágrima é que vê; os olhos, não.
Os olhos são Calvário, negra cruz,
E a lágrima é presença de Jesus."
Teixeira de Pascoaes, Vida Etérea, Lisboa: Assírio & Alvim, 1998, p. 159.

Friday, April 29, 2011

EM MEMÓRIA DA MENINA JUDITH, DEMASIADO GRANDE, DEMASIADO BELA



"E agora? Sinto-me prisioneira
Deixei os prazeres da Terra
E o seu efémero. Toda a alegria morre
Tu és a minha única felicidade,
Senhor

Sob os meus passos A erva foi pisada
A flor em minhas mãos Emurchecida
Em teus prados Quero ser leve
Na tua pradaria meus pés Não deixarão
O menor rasto

Se não fosse o teu amor Como deixar
No vale o rebanho Que me acompanha?
Vou deixá-lo só e Sem pastor
Tu és o único cordeiro Que me arrebanha
A alma

És tu Jesus o cordeiro Que escolhi
Um bem supremo Nada mais me basta
Ter-Te é ter tudo A terra O céu
É ter-me A flor que apanho ó Rei
És tu

Olha pelos meus Olhos o arco-íris
A neve pura a verdura Os vastos horizontes
Olha as ilhas ao longe a seara madura
As borboletas a gaia primavera
Os campos

São teus os navios Que fugiram
Das margens deixando Rastos d'ouro
Teus os festões que ornamentam as Nuvens
Por esse sol que se põe e Desaparece
Em pleno raio

Tua é a Mão que sustenta os Mundos
Em cuja palma crescem as Florestas profundas
Fecundas pelos simples Gestos de teus olhos
Que me seguem com um Olhar de amor
Continuamente

Não serei menos do que a Borboleta
Atraída pela chama que a Chama e inflama
Mais fará o teu amor por mim Atrair-me-á
É nele que quero Dançar até ser
Chama

Ouço já Ouvirei sempre Os sons
Que anunciam essa festa eterna Pedirei
Aos choupos a Harpa muda da sua natureza
Sentar-me-ei perto de ti Unicamente
A ver-te.

Iremos de mãos dadas Ver Maria
Os santos A família dispersa e reunida
Sei que o exílio desta vida tem um fim
Voltar à casa do Pai esse o Único destino
Que te peço."

Thérèse Martin, de Lisieux, O Alto Voo da Cotovia, trad. Maria Gabriela Llansol, Lisboa: Relógio D'Água, 1999, pp. 123-125.

Thursday, April 28, 2011

EFECTIVAMENTE


"- Sim! O Larousse é-nos familiar. Há muito que bebemos a erudição nessa fonte inesgotável...
- Como não hei-de eu chorar os Deuses mortos!... - exclamou o Fauno, com voz cava e completamente alheado das minhas palavras. E tão mortos que deles não resta claridade ou memória! Mas a vida é assim. Tudo morre, efectivamente!"
João Grave, O Último Fauno, 3ª edição, Porto: Lello, 1923, p. 112 (actualiz.)

Wednesday, April 27, 2011

AS CINCO CHAGAS DE CRISTO


"No dia em que o Cristianismo triunfou em todo o vasto universo, já no Olimpo não havia Deuses. Pressentindo a sua catástrofe irremediável e temendo as perseguições dos fanáticos, que lhes não perdoariam, desceram à desolação da terra, escondendo-se nos vales solitários, nos lugares despovoados, abrigando-se em cabanas pobres do deserto e vergando os seus corpos, de linhas incorruptíveis, sob os ásperos trabalhos, para viverem. Os que mais adoravam a existência, mesmo com todas as suas amarguras e as suas vilezas, fizeram-se lavradores, cultivaram o trigo, cavaram a vinha, entregaram-se ao labor das colheitas e das vindimas. Os mais tímidos transformaram-se em castanheiros, em carvalhos ou abetos e lá ficaram para sempre à beira dos caminhos, dando sombras perfumadas aos rebanhos e aos zagais."
João Grave, O Último Fauno, 3ª ed., Porto: Lello, 1923, pp. 35-36 (actualiz.).

Tuesday, April 26, 2011

AGIR




"TOMÁS - A paz esteja convosco! deixai-as exaltadas.
Falam bem melhor do que era de esperar; para além do vosso entendimento...
Sabem sem saber o que é agir, o que é sofrer.
Sabem e não sabem que agir é sofrimento
E o sofrer agir. Não sofre o agente e menos
Age o paciente. Mas ambos se dedicam
A uma eterna acção, eterna paciência
Que todos devem sofrer para que a desejem,
Para que subsista a teia, o desígnio, o risco, pois tal
plano é o próprio agir
E mais o sofrimento; que gire a roda
Embora fixa sempre."

T.S. Eliot, Assassínio na Catedral, trad. José Blanc de Portugal, Lisboa: Cotovia, 1989, pp. 24-25.

Thursday, April 21, 2011

VIDA CORRENDO EM GUERRA


"Só de ouro falso os meus olhos se douram;
Sou esfinge sem mistério no poente.
A tristeza das coisas que não foram
Na minha' alma desceu veladamente.

Na minha dor quebram-se as espadas de ânsia,
Gomos de luz em treva se misturam.
As sombras que eu dimano não perduram,
Como Ontem, para mim, Hoje é distância.

Já não estremeço em face do segredo;
Nada me aloira já, nada me aterra:
A vida corre sobre mim em guerra,
E nem sequer um arrepio de medo!

Sou estrela ébria que perdeu os céus,
Sereia louca que deixou o mar;
Sou templo prestes a ruir sem deus,
Estátua falsa, ainda erguida ao ar..."


Mário de Sá-Carneiro, "Dispersão", in Poesia, Lisboa: Círculo de Leitores, 1990, p. 120.

Wednesday, April 20, 2011

FANTASMÁTICA


"Avoeja à flor dos meus cabelos, ó ave do Paraíso!... Os áditos do elísio abrem-se para nós, a natureza é nossa, e o mar suspira para nos embalar os sonhos, as auras ciciam nos pinhais para nos ensaiarem o murmúrio, a linguagem rumorosa e estremecida dos corações felizes!"

Camilo Castelo Branco, "César ou João Fernandes?", in Noites de Lamego, Porto: Porto Editora, 1991, p. 196.

Tuesday, April 19, 2011

PONTOS POR VEZES ALTOS


"Os Europeus, em permanente agitação, vêem-se forçados a construir solidões. Quanto mais tumultuoso e exuberante é o nosso coração tanto mais a calma e o silêncio que nos atraem. Esses hospícios do meu país, franqueados aos infelizes e aos humildes e escondidos muitas vezes nos pequenos vales, inspiram-nos uma vaga sensação de infortúnio e a esperança de um abrigo. Descortinam-se também por vezes nos pontos altos, onde a alma religiosa, qual planta das montanhas, parece alar-se ao céu para oferecer-lhe os seus aromas."
René de Chateaubriand, René, trad. Vergílio Godinho, Lisboa: Editorial Verbo, 1972, p. 96.

Monday, April 18, 2011

SONHO DOLOROSO



"Quando a índia acabou de proferir estas palavras, ergui-me, fui até junto das cinzas sagradas e prosternei-me em silêncio. Depois, ao afastar-me a largas passadas, exclamei: "Assim passa sobre a Terra tudo o que foi bom, virtuoso, sensível! Homem, não passas de um breve sonho, um sonho doloroso. Só existes pela desventura. Nada significas senão tristeza de alma e infinda melancolia do espírito."
René de Chateaubriand, Atala, trad. Vergílio Godinho, Lisboa: Editorial Verbo, 1972, p. 88.

Thursday, April 14, 2011

A MOCIDADE


"E quantas vezes, nos seus anos ilustres, quando ele fazia História, decerto lhe volveriam à memória, como um trecho de mal lembrada melodia, aqueles meses de Verão e de amor romântico, em que a bela Júlia e o jovem Alípio, abafando as suas risadas, faziam no quarto miserável, sob as telhas, a caça aos mosquitos nas paredes e aos percevejos nas frinchas... Ah! bem o têm dito os poetas: a mocidade, como o Sol, tudo esbate e envolve numa vaga névoa de ouro; e os mosquitos que se matam aos vinte anos, numa alcova amada, parecem deliciosos àqueles, que, aos quarenta, dormem sob cortinados de seda, sentindo na rua, junto à porta, o passo respeitoso da sentinela protocolar!"
Eça de Queirós, O Conde d' Abranhos, Lisboa: Círculo de Leitores, 1993, p. 210.

Tuesday, April 12, 2011

MINHAU À CHEGADA DO FMI



" - Minhau!
- Oh, aí estás - disse o senhor Boom, voltando-se do fogão.
A gata miou em resposta e tornou a dar voltas em redor da perna da mesa, miando. Exactamente como desliza sobre a minha escrivaninha. Prr. Coça a cabeça. Prr.
O senhor Bloom olhava curiosamente, carinhosamente, a fléxil forma negra. Limpa de ver: o lustro de seu pêlo nédio, o tufo branco sob a raiz de seu rabo, os lampejantes olhos verdes. Ele inclinou-se para ela, suas mãos sobre os joelhos.
- Leite para a bichaninha - disse ele.
- Minhau! - gritou a gata.
Chamam-lhes estúpidos. Eles entendem o que dizemos, melhor do que nós os entendemos. Ela entende tudo que quer. Vindicativa, também. Imagino como é que eu pareço a ela. Altura de uma torre? Não, ela pode saltar sobre mim.
- Tem medo das galinhas - disse ele zombeteiro. - Medo dos piupintinhos. Nunca vi uma bichaninha tão boba como esta bichaninha.
Cruel. Natureza dela. Curioso os ratos não guincham nunca. Parece gostarem:
- Miau - disse a gata bem alto."
James Joyce, Ulisses, trad. Antônio Houaiss, Lisboa: Difel, 1983, p. 45.

Monday, April 11, 2011

DE AO PÉ DO MAR


"Poentes de ao pé do mar! Ardem em brasa as praias:
E é singular, vem toda a espuma arroxeada,
Tinta no sangue de milhões, biliões de olaias,
Mortas nalgum jardim, em que oculta cilada!

Volto a página. Agora, um poente de esmeralda,
Um poente afogueado e indolente de Verão:
Nas nuvens cor de cinza, a labareda escalda,
Como a brasa vermelha ilumina um fogão.

Agora, um poente de marfim. Tarde de vento.
Da guarita de um forte arruinado e cinzento
Descubro os barcos a fugir, de inflado pano.

Banhou-se o Azul, talvez, na tina azul do Mar:
Por isso vai revolto, agitado, a rolar
Espuma de sabão Windsor, todo o Oceano!


Alberto d' Oliveira, "Pores-de-Sol", in Obras de Alberto d' Oliveira - Poesia, ed. José Carlos Seabra Pereira, Porto: Lello Editores, 1999, p. 49.

Sunday, April 10, 2011

YOU ONLY LIVE TWICE



"«What do you mean?»
«I've always thought, Julian, that you suffer from the same malady as your enemies, the Christians!»
«What malady?»
«Faith in miracles.»
Julian shook his head.
«If there be neither miracles nor gods my whole life is a madness!...No, we won't speak of that. And do not be too hard upon me on account of my love of ancient ceremonies. I scarcely can explain it to you. The old simple things stir tears in me; and I love the evening more than the morning, autumn better than spring. I love all that  is fleeting! ... Even the perfume of flowers that have faded. ... What would you have, my friend? The gods shaped me so!... That pleasant melancholy, that golden faery twilight, are necessary to me. In the depth of antiquity there is to me something ineffably gracious and fair such as I find in no other region - the shining of sunset on marble mellowed by time. Do not rob me of the mad love of what is no more. Everything that has been, is fairer than the thing that is! Remembrance has more power over my soul than hope...»"

Dmitri Merejkowski, The Death of The Gods, trad. Herbert Trench, London: Constable & Company Limited, 1926, p. 283.

Saturday, April 9, 2011

PAINÉIS DOS GUEDES DE MOIMENTA, QUINTO.



"HIPÓCRATES: En primavera se dan las siguientes enfermedades: confusión mental por el humor melancólico, locura, epilepsia, apoplejía, hemorragias, anginas, reuma, coriza, tos, soriasis, eccema, impétigo, abscesos y artritis.
MAIMÓNIDES: Este aforismo explica el anterior mencionado lo que se dijo antes: que se producen enfermedades en todas las estaciones del año pelo algunas enfermedades son más frecuentes en algunas estaciones del año y en este aforismo cita la mayoría. Completa este tema enumerando las enfermedades propias de la primavera, que es la estación más equilibrada de todas las épocas. Se producen a causa del humor melancólico, como la melancolía y la locura, o a causa del humor flemático, como la epilepsia, el reuma, y la expectoración que es la coriza y tos; a causa del humor rojo, como la úlcera en la piel y los abcesos, enfermedades causadas por la sangre, como las hemorragias y las anginas. Las enfermedades específicas de la primavera son las que se derivan de la disolución de los humores y su flujo hacia fuera y el movimiento natural que los expulsa hacia fuera."
Maimónides, Obras Médicas III - El comentario a los aforismos de Hipócrates, trad. Lola Ferre, Córdoba: Ediciones El Almendro de Córdoba, 2004, pp. 79-80.

Friday, April 8, 2011

PAINÉIS DOS GUEDES DE MOIMENTA, QUARTO.



"Os homens não deviam cortar as árvores. Existe um Deus. (Ia anotando estas revelações nas costas de um envelope.) Mudar o mundo. Ninguém mata por ódio. Divulgar isto (continuou a escrever). Fez uma pausa. Pôs-se à escuta. Um pardal empoleirado na cerca em frente chilreou Septimus, Septimus, quatro ou cinco vezes e depois continuou a extrair as suas notas até se pôr a entoar, numa voz fresca e aguda, palavras em grego que diziam que o crime não existe; então, outro pardal aproximou-se e, juntos entoaram em grego um longo e cristalino canto, empoleirados nessas árvores no prado da vida, por detrás de um rio onde os mortos caminham, um canto que dizia: a morte não existe."

Virginia Woolf, Mrs. Dalloway, trad. José Miguel Silva, Lisboa: Relógio D'Água, 2004, p. 31.

Thursday, April 7, 2011

PAINÉIS DOS GUEDES DE MOIMENTA, TERCEIRO.


"- Você está apaixonado, confesse! - jogou Rodrigo, à queima-roupa.
- O homem de espírito não se apaixona.
- Não. O homem de espírito enforca-se.
- Como assim?
- «Mulheres, nasci duma, fujo de todas!», dizia Santo Agostinho. Eu estou com o santo.
- Por comodidade.
- Por cálculo. Sempre achei caro despir uma mulher.
- Pois, meu velho, acho muito mais caro vesti-la.
- E depois, pedir amor é uma coisa que rebaixa, que humilha.
- É que eu peço amor como os grandes de Espanha pedem esmola: de chapéu na cabeça!
- Bonita frase!
- E uma verdade, Rodrigo. As mulheres valem mais do que a política. E mentem menos do que os políticos."
Júlio Dantas, A Severa, Porto: Porto Editora, 1994, p. 138.

Wednesday, April 6, 2011

PAINÉIS DOS GUEDES DE MOIMENTA, SEGUNDO




"Apostam-se as ambições, ou humildade.
Apostam-se os rancores, ou alegria.
Apostam-se incertezas, ou amor.
Ao fim, quem ganha o jogo é sempre a morte.
Mas, enquanto haja vida, isso que importa?"


Armindo Rodrigues, "Flauta de Cana", in Obra Poética, Lisboa: Sociedade de Expansão Cultural, 1970, p. 97.

Tuesday, April 5, 2011

PAINÉIS DOS GUEDES DE MOIMENTA, PRIMEIRO.


"De quem falar agora se
mais não sou do que
a memória do sol

De quem falar agora se
apenas sou
um homem debruçado no osso
da própria voz."

Casimiro de Brito, "Mesa do Amor", in Ode & Ceia, Lisboa: Dom Quixote, 1985, p. 190.

Monday, April 4, 2011

COURO E CABELO


"E uma menina esguia e sentimental, de bandós em asas de corvo, que havia instantes olhava Garrett num encantamento, não se pôde conter mais que não dissesse:
- O mais feliz é o mais sábio...
- Enganam-se vossas excelências, minhas senhoras - concluiu o poeta, cravando os seus olhos verdes na divina marquesa. - O mais feliz é o que tem a coragem de não amar, sendo amado...
- O sr. Garrett? - interrompeu maliciosamente a marquesa, compreendendo-lhe a intenção e mordendo o beiço.
- Não, minha senhora.
- Então o sr. Garrett não é amado? - gemeu tristemente a menina dos bandós pretos.
- Mas quando o sou, nunca tenho a coragem de não amar, minha senhora...
- Por isso dizem que tem mais coração do que cabeça - sentenciou a baronesa, cujo queixo se desdobrou repentinamente em três refegos de gordura.
- Nunca se tem coração demais - objectou o poeta, afastando uma madeixa da cabeleira postiça que lhe tombara sobre a orelha. - O que se pode ter é cabeça de menos...
- Cabelo de menos, era o que o sr. Garrett queria dizer..."
Júlio Dantas, A Severa, Porto: Porto Editora, 1994, p. 114.

Sunday, April 3, 2011

COURO E CORPO


"Filipe nunca tinha visto uma mulher nua à sua espera na cama. Estava apaixonado. Tinha perigo agora de se masturbar na cama, agora que estava apaixonado por uma mulher nua na cama e esflorá-la. Era Elisa, estava apaixonado por o que Elisa queria, que Elisa é que quis e que queria, tê-lo na cama com ela. Filipe a isso não ficou despercebido e olhou-a. Faltava encontrar Velez, encontrar-se com Velez para Velez lhe dizer quando era o coito ou quando podia ser o coito e o marido ir os três dias a Mora. Mas Elisa era míope, muito míope mesmo."
António Gancho, As Dioptrias de Elisa, Lisboa: Assírio & Alvim, 1996, p. 28.

Saturday, April 2, 2011

RECEITUÁRIO DE GRANDE UTILIDADE


" - Mestre - insistiu de novo Madge. - Jean disse-me há tempos que se pode achar os afogados com um pão onde se pôs mercúrio. Faz-se um buraco na côdea e deita-se lá para dentro. Atira-se o pão à água e ele pára mesmo por cima do afogado.
- Sei lá! - disse o moleiro. - Isso não são coisas de meninas. Basta de histórias dessas, Jean!
- Foi a menina Madge que me perguntou - respondeu o rapaz.
- Eu meteria lá dentro chumbos de caça - disse Madge. - Aqui não há mercúrio. Talvez se encontrassem afogados no tanque.
À porta ela esperava pelo crepúsculo, com o pão debaixo do avental, e pequenos chumbos na mão fechada. O mendigo devia ter tido fome. Afogara-se no tanque, e ela descobriria o corpo e, tal como o gigante, poderia moer farinha e amassar a massa com ossos de morto."

Marcel Schwob, O livro de Monelle, trad. Helena Moura e José Colaço Barreiros, Lisboa: Teorema, 1994, p. 37.

Friday, April 1, 2011

APERIRE


"Caminha no seio do informe
E do irrespirável,

Caminha
Para que em nós perdurem
O ínfimo,

O obscuro

E
A marca de uma extrema solidão."

Yves Namur, Figuras do muito obscuro, trad. Fernando Eduardo Carita, Lisboa: cavalo de ferro, 2005, p. 26.