Sunday, September 30, 2007

DESCONFIANÇAS

XLVIII

"Grandes entre os homens só o poeta, o padre e o soldado.
O homem que canta, o homem que sacrifica e que se sacrifica.
O resto é feito para o chicote.
Desconfiemos do povo, do bom senso, do coração, da inspiração e da evidência."



Charles Baudelaire, O Meu Coração a Nu, trad. João Costa, 2ª ed., Lisboa: Guimarães Editores, 1999, p. 82

Friday, September 28, 2007

DOLOR URGET ME


"Ecce sonat in aperto
vox clamantis in deserto:
nos desertum, nos deserti
nos de pena sumus certi.
nullus fere vitam querit,
et sic omne vivens perit.
omnes quidem sumus rei,
nullus imitator Dei,
nullus vult portare crucem,
nullus Christum sequi ducem.
quis est verax, quis est bonus,
vel quis Dei portat onus?"


Carmina Burana, 10, apres. Francesco Maspero, Milão: Tascabili Bompiani, 2002.

Saturday, September 22, 2007

CORRER COM O TEMPO



"Agora que o mundo deslizou como uma bola
das mãos de deus e cruza a noite vazia
dos espaços sabemos que a morte nos espera
disposta como uma refeição à nossa mesa.
Rendemos à sorte de cada minuto as nossas
vidas e corremos de monte em monte como
correria uma canção levada pelo vento."


Paulo Teixeira, "Zona Biográfica", in Inventário e Despedida, Lisboa: Caminho da Poesia, 1991, p. 54.

Wednesday, September 19, 2007

FAZER AS MALAS PARA PARTE NENHUMA


"Faze as malas para parte nenhuma!
Embarca para a universalidade negativa de tudo
com um grande embandeiramento de navios fingidos -
Dos navios pequenos, multicolores, da infancia!
Faze as malas para o Grande Abandono!
E não esqueças, entre as escovas e a thesoura,
A distancia polychroma do que se não pode obter.
Faze as malas definitivamente!
Que és tu aqui, onde existes gregario e inutil -
E quanto mais util mais inutil -
E quanto mais verdadeiro mais falso -
Que és tu aqui? que és tu aqui? que és tu aqui?
Embarca, sem malas mesmo, para ti mesmo diverso!
Que te é a terra habitada senão o que não é comtigo?"


Álvaro de Campos, Vida e Obras do Engenheiro, ed. Teresa Rita Lopes, 2ª ed. Lisboa: Editorial Estampa, 1992, p. 107.

Saturday, September 15, 2007

LUZ AZUL-DE-VERÃO



"Há vestígios verdes nas telas vazias das molduras douradas"



Mário de Sá-Carneiro, Céu em Fogo, XVI, in "Prosa", Lisboa: círculo de Leitores, 1990, p. 286.

Sunday, September 9, 2007

SALVAR A MEMÓRIA



"Propendemos para ser tudo, por nisso vermos o único remédio de não sermos reduzidos a nada. Queremos salvar a nossa memória, pelo menos a nossa memória. Que tempo durará? Pelo menos o que durar a vida humana. E se salvássemos a nossa memória em Deus?"


Miguel de Unamuno, Do Sentimento Trágico da Vida, trad. Cruz Malpique, Lisboa: Relógio d'Água, 2007, p. 52.

Wednesday, September 5, 2007

DE LÁBIOS MUDOS, OLHOS APAGADOS


"Não passas de uma sombra turva, de um duro núcleo de indiferença, de um olhar neutro que foge dos olhares. A partir de agora, de lábios mudos, olhos apagados, saberás detectar nas poças de água, nos vidros, sobre as carroçarias reluzentes dos automóveis, os reflexos fugazes da tua vida suspensa."


Georges Perec, Um homem que dorme, trad. Maria Jorge Vilar de Figueiredo, Lisboa: Ed. Presença, 1991, p. 23.

Monday, September 3, 2007

THE EMPTY WAS TRANSFORMED INTO POSSESSION







"The empty was transformed into possession,
The cold burst into flames; creation was on fire
And his weak moment blazing like a bush,
A symptom of the order and the praise;
And he had place like Abraham and Jacob,
And was incapable of evil like a star,
For isolation hab been utterly consumed,
And everything that could exist was holy."


W.H. Auden, "Pascal", in Outro Tempo, trad. Margarida Vale de Gato, Lisboa: Relógio D'Água, 2003, p. 72.