"Os inquéritos confirmam estas análises. Na alvorada do III milénio os valores mais apreciados na sociedade francesa são, por ordem: a honestidade, a justiça, a amizade, a igualdade, a família, o respeito pelo ambiente; o patriotismo chega em vígésimo segundo lugar. Os valores «de proximidade» são privilegiados: não sofrer e não mais fazer sofrer são os imperativos mais acatados, com uma nítida vontade de reconciliar prazer e bem. Praticar o bem sem dor: esta atitude é reveladora do abandono da culpa e da ideia de pecado original. Daí os acessos de generosidade orquestrados pelos media, associando dons e divertimentos, ao estilo televisivo. As causas humanitárias, as catástrofes, suscitam a formação de comités de apoio que, na Internet, avizinham com os clubes de especulação bolsista e os de pornografia.
Paradoxalmente, o desejo de ser feliz a qualquer preço age como uma nova angústia: «Sede felizes» tornou-se o primeiro mandamento. Este é objecto de um tal consenso que se transforma numa pressão culpabilizante para muitos indivíduos que não conseguem encaixar-se no modelo de felicidade transmitido pelos media. Stress e depressão conjugam-se admiravelmente, como que numa evocação da expulsão do paraíso, momento a partir do qual «a felicidade já não é deste mundo»"
Georges Minois, As Origens do Mal, trad. Carlos Correia Monteiro de Oliveira, Lisboa: Teorema, 2004, pp. 433-434.