"Nenhuma das fontes mais antigas menciona se um golem é dotado de palavra ou não. Mas este autómato possuía o dom da memória e, sem reflectir, obedecia a todas as ordens mecanicamente, desde que estas fossem dadas a intervalos regulares. Caso contrário, o golem podia perder as estribeiras.
Os golens também cresciam, todos os dias, mais uns centímetros: aspirando, segundo parece, a alcançar a estatura gigantesca do Adão cósmico - e poder, assim, esmagar o seu criador e dominar o mundo.
- O tamanho dos golens - afirmou Utz - não tinha limite. Eram altamente perigosos.
Contava-se que os golens usavam uma tira de metal, chamada shem, à volta da testa ou debaixo da língua. O shem tinha inscrita a palavra hebraica emeth, a verdade divina. Quando um rabino queria destruir o golem por ele criado, apagava a primeira letra de modo a que emeth se lesse meth, 'morte', e o golem dissolvia-se.
- Estou a perceber - disse eu. - O shem era uma espécie de bateria?
- Pois.
- Sem a qual a máquina não funcionava.
- Também.
- E o rabino Loew...?
- Queria ter um servo. Era um bom homem de negócios. Queria um criado sem ter de pagar um salário.
- E que não lhe respondesse mal."
Bruce Chatwin, Utz, trad. José Luís Luna. Lisboa: Quetzal Editores, 1991, pp. 39-40.
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