"Fui pois escutar aquele ancião. Devia a sua fama mais à rotina que à inteligência e à memória. Se, incerto sobre uma questão, alguém lhe vinha bater à porta para o consultar, voltava ainda mais incerto. Admirável aos olhos de um auditório, era uma nulidade na presença de alguém que viesse interrogá-lo. Possuía uma maravilhosa facilidade de palavra, mas a substância dos seus discursos tinha pouco sentido e nenhum valor. Quando acendia o seu fogo, enchia a casa de fumo, não a tornava clara com luz. A sua árvore, toda em folhagem, oferecia de longe um aspecto imponente; de perto, quando a examinavam atentamente, achavam-na estéril."
Pedro Abelardo, "Carta a um amigo, ou narrativa das minhas desventuras", in Cartas de Abelardo e Heloísa, trad. Franco de Sousa, Lisboa: Editorial Estúdios Cor, s.d., p.19.