Saturday, December 30, 2006
OUVIR NO VERÃO
"Ouvir no verão
O órgão de abafadas tempestades,
Banharmo-nos na luz de outono,
Na margem do dia azul.
De vez em quando ficaremos parados
À beira da escura fonte,
Para olhar profundamente para o silêncio,
Para procurar o nosso amor"
Georg Heym,"Deine Wimpern, die langen...", in "Expressionismo Alemão - Antologia Poética", trad. João Barrento, Lisboa: Ática, p. 141
Sunday, December 24, 2006
SOULSTÍCIO
"Ele nem sequer se assemelha à luz nunca tocada
E estende sobre nós a cura
Os ramos de oliveira como o braço de quem afaga
Ele faz-nos provar o paladar inesgotável da escrita
Ele parte a broa e dá-nos ambas as mãos
É ele que conserva o mecanismo dos pássaros
É ele que move os moleiros quando passam os moinhos
É ele que puxa a corda dos bois e a linha
Do céu que assinala os limites dos montes
Ele é que eleva o corpo dos santos, é ele
Que amestra o pólen para o mel, ele decide
A medida da flor na farinha
Ele deixa-nos tocar a orla dos seus mantos"
Daniel Faria, "Dos Líquidos", V.N.Famalicão: Quasi Edições, 2003, p. 72
E estende sobre nós a cura
Os ramos de oliveira como o braço de quem afaga
Ele faz-nos provar o paladar inesgotável da escrita
Ele parte a broa e dá-nos ambas as mãos
É ele que conserva o mecanismo dos pássaros
É ele que move os moleiros quando passam os moinhos
É ele que puxa a corda dos bois e a linha
Do céu que assinala os limites dos montes
Ele é que eleva o corpo dos santos, é ele
Que amestra o pólen para o mel, ele decide
A medida da flor na farinha
Ele deixa-nos tocar a orla dos seus mantos"
Daniel Faria, "Dos Líquidos", V.N.Famalicão: Quasi Edições, 2003, p. 72
Saturday, December 23, 2006
LUZ
"Como se enreda na luz o coração
à sombra dos seus mitos e de corpos
tão jovens que já apercebidos
se movem para longe do nosso olhar
guardando a tábua rasa da ausência.
Como se enreda o coração no corpo
e sem palavras te abandona este poema
e sem razões te alucina e aprisiona.
Como nos perdemos todos nesta luz
que os corpos trazem como coisa sua
e que só às vezes pousa no poema
e te deixa perdido e só à beira do lume."
Luís Filipe Castro Mendes, "A Ilha dos Mortos", Lisboa: Quetzal ed., 1991. p. 45
à sombra dos seus mitos e de corpos
tão jovens que já apercebidos
se movem para longe do nosso olhar
guardando a tábua rasa da ausência.
Como se enreda o coração no corpo
e sem palavras te abandona este poema
e sem razões te alucina e aprisiona.
Como nos perdemos todos nesta luz
que os corpos trazem como coisa sua
e que só às vezes pousa no poema
e te deixa perdido e só à beira do lume."
Luís Filipe Castro Mendes, "A Ilha dos Mortos", Lisboa: Quetzal ed., 1991. p. 45
Wednesday, December 20, 2006
MAIS COISAS D'ÁGUA
"Oh vem, de branco, - do immo da folhagem!
Os ramos, leve, a tua mão aparte.
Oh vem! Meus olhos querem desposar-te,
Reflectir-te virgem a serena imagem."
Camilo Pessanha, "Clepsydra", ed. Paulo Franchetti, Lisboa: Relógio d'Agua, 1995, p. 121.
Monday, December 18, 2006
FRAGMENTA 1
"As relações entre estes conceitos formam uma paisagem com que a linguagem nos presenteia em inúmeros fragmentos; juntá-los é-me demasiado difícil. Consigo apenas fazer um trabalho muito imperfeito."
Ludwig Wittgenstein, "Cultura e Valor", trad. Jorge Mendes. Lisboa: Ed. 70, 1996, pág. 115.
Saturday, December 16, 2006
REVOLUÇÕES
"E, depois que o espírito começou a mover-se, separou-se de tudo o que era movido, e, à medida que o espírito se movia, tudo se ia separando. E à medida que as coisas se moviam e separavam, a revolução fazia-as distanciar-se ainda mais." (frg. 12 Diels)
"Assim se moviam e separavam, por efeito da força e da velocidade. A velocidade produz a força. Porém a sua velocidade em nada se assemelha à de nenhuma outra coisa, das que actualmente existem entre os homens, mas é muitas vezes mais rápida." (frg. 9 Diels)
Anaxágoras (in "Hélade", trad. Maria Helena da Rocha Pereira, Coimbra: Minerva, 1990, p.231)
Friday, December 15, 2006
GOTTFRIED BENN MEDITADO JUNTO AO OCEANO (DU MUSST DIR ALLES GEBEN)
A TI TUDO TENS DE DAR
"Dá no teu contentamento,
no morrer, trocados antes
o sonho e o pressentimento,
esta hora, o seu alento
tão de umbelas sussurrantes,
a foice, as marcas do Verão
dos campos orientadas,
bilha e taça de água em tão
doce fadiga inclinadas
Tens de dar-te tudo, os
deuses nada te vão dar,
dá-te esse leve pairar
por entre rosas e luz,
ao que em céus já azulou
vai-te a seu encanto dando,
o último som passou
escuta-o silenciando"
Gottfried Benn, "50 Poemas", trad. Vasco Graça
Moura, Lisboa: Relógio d'Água, 1998, págs. 36-37
Monday, December 11, 2006
TRÊS MEDIAÇÕES DE JOHANNES SCHEFFLER
1 - "O Verbo que te leva e me leva a todas as coisas
Levo-o eu também e o recolho em mim"
2 - "Se a tua visão se ofusca ao fixar o sol,
a culpa é dos teus olhos, e não da grande luz"
3 - "Tu próprio fazes o tempo. Os relógios são os sentidos.
Se fizeres cessar a tua inquietação, o tempo acaba"
Angelus Silesius, "A rosa é sem porquê", trad. José Augusto Mourão, Lisboa: Ed. Vega, 1991, págs. 41-43
Tuesday, December 5, 2006
CAMÕES SOBRE PASCOAES
"XVI. Nós habitamos o Cárcere, meus amigos! Aproveitemos algum raio da Luz exterior, coado pelas frestas!
Vivamos, ao menos, esta branda e difusa claridade interior, nesta meia sombra, que nos dá a ilusão da luz, muito embora altere e espectralize as formas e as figuras.
Sim: vivamos, neste país da noite e do mistério e da saudade da vida, o nosso divino Pressentir, o nosso estado de simpatia, na esperança da perfeita Visão."
Teixeira de Pascoaes, "Verbo Escuro"
"Vós outros, que buscais repouso certo
na vida, com diversos exercícios;
a quem, vendo do mundo os benefícios
o regimento seu está encoberto;
dedicai, se quereis, ao desconcerto
novas honras e cegos sacrifícios;
que, por castigo igual de antigos vícios,
quer Deus que andem as cousas por acerto.
Não caíu deste modo de castigo
quem pôs culpa à Fortuna, quem somente
crê que acontecimentos há no mundo.
A grande experiência é grão perigo;
mas o que a Deus é justo e evidente
parece injusto aos homens e profundo."
Camões, ed. de Maria de Lourdes Saraiva, IN-CM, 1994 (2ª ed.), "Sonetos" p. 302
Monday, December 4, 2006
SAUDAÇÃO
Saturday, December 2, 2006
TITANICA
"Quando Vénus Urânia emergiu das ondas ficou lá um buraco do tamanho de um homem. Estrelas-do-mar, um prego enferrujado, minúsculas armações que em vida tinham sido famélicos peixes aderiram às partes lívidas e frescas que a lindíssima deusa abrira em pleno oceano. Ninguém tapou aquela espécie de vácuo e por expressa ainda que ignota determinação cósmica Titânia nasceu ali. Claro está que ao nascer aquele corpo novo - e bem diferente, diga-se, de tudo o que os peixes miravam e a lua buscava iluminar naquela noite oceânica, escura como eu - não nasceu nada que se aproveitasse: aquele corpo seria o de Titânia, não era ainda o corpo de Titânia. Dentro das proporções que lhe cabiam tinha salas enormes, cheias de portas e passagens secretas. Abria-se uma - fechavam-se mil. Abria-se outra: ficavam sempre muitas por abrir. Só no fim das salas todas corridas se saberia exacto o nome que havia de convir à recém-chegada.
Ficou assim a nada-viva muito quietinha sobre o meio das ondas. Às vezes olhava para cima, outras vezes olhava para os lados e para baixo, a ver o que era e o que não era. Ia assim dando conta do recado. Mas pouco mais alcançava do que paredes-líquenes, aranhas-de-avental, estrelas-do-mar - azuis!- a que às noites porém vinham juntar-se as estrelas do ar, que estão no céu."
Mário Cesariny, "Titânia - História Hermética em Três Religiões e um Só Deus Verdadeiro com Vistas a Mais Luz Como Goethe Queria", Lisboa: Assírio & Alvim, págs. 11-12.
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