Thursday, June 12, 2008

APROXIMAÇÃO AO AZUL EM TEMPO DE LUTO 3


"Vejo que a morte se inspira na carne
que a luz martela de leve.
Essas mulheres debruçadas sobre a frescura
veemente da ilusão,
nelas - envoltas pela sua roseira em brasa -
vejo os meses que respiram.
Os meses fortes e pacientes.
Vejo os meses absorvidos pelos meses mais jovens.
Vejo o meu pensamento morrendo na escarpada
treva das mulheres.

E digo: elas cantam a minha vida.
Essas mulheres estranguladas por uma beleza
incomparável.
Cantam a alegria de tudo, minha
alegria
por dentro da grande dor masculina.
Essas mulheres tornam feliz e extensa
a morte da terra.
Elas cantam a eternidade.
Cantam o sangue de uma terra exaltada."


Herberto Helder, Lugar, in Ou o poema contínuo, Lisboa: Assírio & Alvim, 2004, pp. 143-144.

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