Sunday, November 22, 2009

LINGUAGEM DE PARAÍSO SACRO-PROFANO

Tiestes

Acredita-me, a grandeza seduz usando falsos nomes,
e não é razoável temer-se a vida dura. Enquanto estive no [trono
nunca cessei de ter medo, até receava a espada
que me pendia do flanco. Oh, como é bom
não ser obstáculo para ninguém, tomar as refeições em [segurança,
reclinado no chão! Nas cabanas não tem lugar o crime,
é seguro o alimento tomado numa mesa exígua.
O veneno bebe-se em taças de ouro: falo por experiência!
Sou livre de preferir o infortúnio à riqueza.
Ante a minha casa, alcandorada no cume
de alto monte, não treme a população humilde;
não tenho palácio enorme o esplendor do marfim
nem careço de guardas de corpo para proteger o sono;
não pesco com uma esquadra, não faço recuar o mar
lançando-lhe molhes, nem alimento um ávido ventre
à custa dos povos tributados; nenhum latifúndio
possuo para lá do país dos Getas ou dos Partos;
não sou incensado, nem, em detrimento de Júpiter,
em minha honra se ornamentam altares; não tenho jardins [suspensos
onde balance um bosque plantado, nem fumegantes lagos
aquecidos por grande multidão, não dedico o dia ao sono,
nem passo a noite acordado entregue a Baco!
Não causo medo a ninguém, a minha casa inerme está [segura,
na minha modéstia gozo de um profundo sossego.
O cúmulo do poder é passar sem ele!"


Séneca, Tiestes, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa: Verbo, 1996, p. 78.

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