Tuesday, November 10, 2009

O CÉU SOBRE BERLIM (2008)



"Nos fins de tarde de Inverno, em Berlim, a minha mãe levava-me, às vezes, às compras. Era uma Berlim escura e desconhecida que se estendia à minha frente à luz dos candeeiros. Ficávamos no Velho Ocidente, cujos arruamentos eram mais simples e modestos do que aqueles que mais tarde vieram a ser os preferidos. As varandas e as colunas já não se viam muito bem, mas havia luz nas fachadas. Fosse através das cortinas de musselina, das persianas ou até da camisa do candeeiro de sala, aquela luz pouco revelava acerca dos quartos iluminados. Não tinha nada a ver com nada, apenas consigo própria. Atraía-me e fazia-me pensar. Hoje, ao recordá-la, ainda exerce o mesmo efeito sobre mim. Transporta o meu pensamento para um dos meus postais ilustrados. Este mostrava uma praça de Berlim. As casas que a circundavam eram de um azul suave, o céu nocturno, onde se via a lua, era de um azul mais escuro. A lua e todas as janelas representadas no azul deste postal eram transparentes. Tinham de ser olhados diante de um candeeiro para que um clarão amarelo irrompesse das nuvens e das fileiras de janelas. Não conhecia a zona representada. A legenda dizia "Porta de Halle". Porta e átrio nela se reuniam, formando a gruta iluminada na qual encontro a recordação da cidade de Berlim no Inverno."

Walter Benjamin, Infância em Berlim por volta de 1900, trad. Cláudia de Miranda Rodrigues. Lisboa: Relógio D'Água, 1992, pp. 178-179.

No comments: