"Olharam pela janela. Nada; vazio. Só uma corrente muito fria fazia pensar que o comboio corria que nem uma fúria.
-Estranho - reparou Ryszpans. - Não se vê absolutamente nada. Vazio em cima, vazio em baixo, vazio à minha frente.
- Que sensações! Parece dia porque está claro, mas não se vê o sol e não há o mínimo sinal de nevoeiro.
- Voamos como no espaço. Que horas podem ser?
Olharam os relógios ao mesmo tempo. Passado um momento o engenheiro levantou os olhos e encontrou o olhar do companheiro que dizia o mesmo:
- Não posso ler nada. As horas fundiram-se numa só linha negra e ondulada...
- Pela qual os ponteiros passam com um movimento errante e sem sentido.
- As ondas da persistência transvazam-se uma na outra, sem princípio nem fim...
- O crepúsculo do tempo..."
Stefan Grabinski, "A linha cega", in O demónio do movimento, trad. Maria José e Wojciech Charchalis, Lisboa: Cavalo de Ferro, 2003, p. 260.