Sunday, December 5, 2010

SOB AS OLIVEIRAS


"Eu tinha então nove anos, tinha pneumonia e era Domingo de Ramos.
«Que queres que te traga, Musia, da festa de Ramos?» - a minha mãe já vestida para sair rodeada assimetricamente - por um lado Andriucha com a sua nova capa do colégio que o fazia ver-se maior ainda e por outro Asia, com o meu casaco do ano anterior, que a ela chegava até aos pés e a tornava ainda mais pequena. «Um diabo numa garrafa!» - disse imediatamente, com a mesma impetuosidade com que o Diabo havia saído da garrafa. «Um diabo? - surpreendeu-se a minha mãe -, e não um livro? Ali também os vendem, há lojas inteiras com eles. Por dez copeques podem-se comprar até cinco livritos sobre a defesa de Sebastópolis, por exemplo, ou sobre Pedro, o Grande. Pensa nisso.» - «Não, mesmo assim... um diabo...» - disse, em voz muito baixa, com dificuldade e vergonha. - «Bom, se queres um diabo trago-te um diabo.» - «Eu também quero um diabo!» - disse imediatamente a minha eterna imitadora Asia. - Não, não terás nenhum diabo!» - repliquei eu em voz baixa e ameaçadora. «Mamã! Ela diz que eu não vou ter nenhum diabo!» - «Bom, claro que não... - disse a mamã -. Em primeiro lugar, Musia disse primeiro, em segundo, para quê comprar duas vezes a mesma coisa e ainda por cima uma tontice dessas? De qualquer maneira, vai partir-se.» - «Mas eu não quero um livro sobre Pedro, o Grande! - começou a guinchar Asia -. Também se partirá!»"


Marina Tsvietaieva, O Diabo, trad. Manuel Dias, Lisboa: Relógio D'Água, 1994, pp. 51-52.

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