"- Tretas - As faces do Chefe, brancas mesmo no verão, faziam covinhas. - Eles nem sequer sabem definir perigo. Acham que perigo quer dizer algo físico, um arranhão que deita um pouco de sangue e os jornais fazem uma grande história com isso. Bom, o perigo não tem nada a ver com isso. O verdadeiro perigo é viver. Claro, aquilo a que chamamos viver é apenas o caos da existência, mas mais do que isso é o esforço de desmantelarmos tudo, a existência, até atingirmos um ponto onde o caos original é restaurado e buscar forças à incerteza e ao medo que o caos contém, para recriar a existência instante a instante. Não há trabalho mais perigoso do que este. Na existência-em-si não há o medo, ou a incerteza, mas é o viver que os cria. E a sociedade, basicamente, não tem qualquer sentido, é apenas um banho romano misto. E a escola, a escola é a sociedade em miniatura, é por isso que nos estão constantemente a dar ordens. Um punhado de homens cegos diz-nos o que temos de fazer, retalha-nos as nossas imensas capacidades."
Yukio Mishima, O Marinheiro que perdeu as graças do mar, trad. Carlos Leite, 3ª ed., Lisboa: Assírio & Alvim, 2008, pp. 53-54.
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