Wednesday, May 7, 2014
TOMBOS
"Com seus tombos internos, as nevralgias sabotam
os trilhos que nos poderiam conduzir, pela sombra,
à perfeita ficção de um mundo definido pela polidez
esclerosada do discurso. Porque a Beleza, no perímetro
em que vivemos, é sempre uma meretriz de baixo coturno,
lamentando-se por ter perdido as sapatilhas um dia
em que dançava nua, atenta aos horrores da paisagem,
sobre o relevo dos túmulos. Acerca dos padrões de lantejoulas
ou o berloque das rimas, escreveu Baudelaire, deixando-
nos contudo uma incómoda pergunta: a que
se referia ele ao dizer que só quem no sonho
se soube corromper pode aspirar um dia a descansar
pela palavra no solo que lhe reservou a sepultura?
(La porte est fermée: tu ne ressusciteras plus!)
Fernando Guerreiro, Grotesco, Lisboa: Black Sun Editores, 2000, pp. 35-36.
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