Sunday, January 29, 2017

HORA





"[Relógio da Cidade:] Dir-vos-ei: todos somos relógios e sabemos que não há cousa que não tenha sua hora no mundo. O rir, o chorar, o trabalho e o descanso; a fome e a fartura, tudo tem sua hora. Donde procede que não é fora de rezão que os homens tratem talvez de seu cómodo e tal de seu adiantamento, pois é certo que, para se regerem e derigirem a bons fins e a termos úteis que deu Deus entendimento que negou às alimárias, a quem deu menos, porque delas não queria receber tanto. Mas, contudo, já se sabe que é demasiada fanfarronice que o ditoso não queira algua hora ser mofino, persuadido de que as boas andanças são morgado que haja de andar em sua família para sempre, sem que se possa perder nem alhear. Por isso se diz, vulgarmente, que tudo tem sua hora."



D. Francisco Manuel de Melo, Os Relógios Falantes, ed. Pedro Serra, Braga-Coimbra: Angelus Novus, 1998, p. 22. 

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