Monday, March 25, 2019

TER NOS OLHOS



"É preciso estar cego
ou ter nos olhos aparas de vidro, 
cal viva,
areia a ferver, 
para não ver a luz que brota em nossos actos, 
que ilumina por dentro a nossa língua, 
a nossa palavra diária.

É preciso querer morrer sem um sinal de glória e de alegria, 
sem participação nos hinos futuros, 
sem ficar na lembrança dos homens que hão-de julgar o passado 
sombrio da Terra. 

É preciso querer já em vida ser passado, 
obstáculo sangrento, 
coisa morta, 
seco olvido."


Rafael Alberti, Antologia Poética, selec. e trad. Albano Martins, Porto: Campo das Letras, 1998, p. 47. 

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