Sunday, May 17, 2020

REVENANT




"Há ânsias de voltar, de amar, de não ausentar-se
e há ânsias de morrer, combatido por duas
águas unidas que jamais hão-de istmar-se. 

Há ânsias de um beijo enorme que amortalhe a Vida, 
que acaba na áfrica de uma agonia ardente, 
suicida!

Há ânsias de... não ter ânsias, Senhor; 
a ti aponto-te o dedo deicida:
há ânsias de não ter tido coração. 

A primavera volta, volta e partirá. E Deus, 
curvado em tempo, repete-se, e passa, passa
carregando a espinha dorsal do Universo. 

Quando as têmporas tocam seu lúgubre tambor, 
quando me dói o sonho gravado num punhal, 
há ânsias de ficar plantado neste verso!"


César Vallejo, Antologia Poética, trad. José Bento, Lisboa: Relógio D'Água, 1992, p. 37. 

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