Friday, April 23, 2010

SILVESTREM TENUI MUSAM MEDITARIS



"Não queiras, não perguntes, não esperes.
Isto que passa como vida e tu
medes em dias, horas e minutos,
ou como tempo passa e vais medindo
em rugas e lembranças e em sombrias
e plácidas visões de coisa alguma,
às vezes sorridentes, mas sombrias;
sim: isto, a que dás nomes, que separas
do resto em que surgiu, de que surgiu;
isto, que já não queres, não interrogas,
de que já nada esperas, mas que queres,
por que perguntas sempre, e por que esperas;
isto, que não és tu, nem vai contigo,
nem fica quando vais; em que não pensas,
porque ao medir apenas medes e
nada fazes mais que medir - só isto,
apenas isto, isto unicamente:
não queiras, não perguntes, não esperes,
que o pouco ou muito é tudo o que te resta."


Jorge de Sena, Fidelidade, in Poesia III, Lisboa: Edições 70, pp. 45-46.

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