Monday, August 20, 2012

O FUTURO O PRESENTE




"Junto à outra plataforma os deuses ainda estão vivos. Conversam. Olham para o mundo impávidos ao tempo, usufruindo a medida sábia de suas inquietações. Avanço mais um passo. Sou empurrado, atravesso séculos na companhia de um símbolo de verdade que se trespassa de mim para mim. Alegro-me com a vida, entristeço-me com a rotineirice bélica, capacidade de destruição e tragédia - ao mesmo tempo que é essa mesma destruição do homem que lhe dá incentivos de grandeza. Os despojos pertencem aos artistas - a Homero, a Picasso. E no perfurar longo da Odisseia ergue-se em cortina de fundo toda a Guernica; melhor ainda, a destruição de Tróia feita a palmo ao longo da Ilíada. Destroços, relíquias, pedras atentas ao futuro, por toda a banda uma gama invisível de sentimentos que se exala da imaginação, existência donde o homem foi completo. Herança suculenta de quem nunca baqueou à mensagem, não hesitou no caminho de ser ele um ser definido à medida do seu próprio defeito. A luta é para afirmar aos deuses que eles tratavam com homens, com seres que na sua geometria de entendimento se aproximavam da divindade, alheios a qualquer favor. A imploração era o Mito, o Oráculo de quem os encaminhava. O futuro a Deus, o presente aos homens. Aqui a verdade sem medo que nos legaram. O testamento de Sócrates, o final do seu depoimento frente aos juízes, antes da condenação, é a resposta mais genial aos que o acusavam de perverter a juventude de Atenas «agora partimos - eu para morrer, e vós para viver. O que é melhor, só Deus sabe»."


 Ruben A., Um Adeus aos Deuses, Lisboa: Assírio & Alvim, 2010, p. 171.

No comments: