"Só de ouro falso os meus olhos se douram;
Sou esfinge sem mistério no poente.
A tristeza das coisas que não foram
Na minha' alma desceu veladamente.
Na minha dor quebram-se as espadas de ânsia,
Gomos de luz em treva se misturam.
As sombras que eu dimano não perduram,
Como Ontem, para mim, Hoje é distância.
Já não estremeço em face do segredo;
Nada me aloira já, nada me aterra:
A vida corre sobre mim em guerra,
E nem sequer um arrepio de medo!
Sou estrela ébria que perdeu os céus,
Sereia louca que deixou o mar;
Sou templo prestes a ruir sem deus,
Estátua falsa, ainda erguida ao ar..."
Mário de Sá-Carneiro, "Dispersão", in Poesia, Lisboa: Círculo de Leitores, 1990, p. 120.
No comments:
Post a Comment