Monday, August 16, 2010

AO SÉCULO DAS LUZES



"O Século das Luzes era, no fim de contas, resultado duma cultura burguesa, vulgar até à intimação, em que o sublime caía a golpes duma razão que tinha tudo para se impor: a mediocridade salutar e a superficialidade sonora. Montesquieu era um pavão, com muito de fictício e outro tanto de preconceituoso. Um homem que diz «aos trinta e cinco anos eu amava ainda», ou é um celerado ou um tolo. Voltaire, Rousseau, Diderot são plebeus, e é plebeu o carácter das Luzes. E mesmo quando a nobreza espia o momento de se introduzir no campo das Letras, é para procurar aí uma identidade nova que lhe permita sobreviver, mais do que restaurar as suas prerrogativas. Já não lhe interessam as prerrogativas, está reduzida a uma nuance. A própria Corte portuguesa era burguesa, com os seus vícios acentuados ao ponto de significarem uma impotência da imaginação. D. João V, o tipo de soberano que, como Eduardo VII de Inglaterra, teria de se chamar um canalha se não fosse rei, dava o tom à Casa de Bragança: nela, a vaidade presumia todos os desregramentos, da líbido e do erário."


Agustina Bessa-Luís, Sebastião José, 3ª ediç., Lisboa: Guimarães Editores, 2003, pp. 21-22.

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