"Entre o desejo e a vontade dum homem há muitas vezes um abismo. Se Sebastião José fizesse corresponder o desejo íntimo com a vontade incansável de lutador, decerto ficava no seu solar de Oeiras, e ninguém se opunha a isso. Mas o elo que o ligava à Corte desaparecera, o seu amigo, o seu soberano, morrera. Há na natureza do homem um espaço reservado à fidelidade, o espaço do samurai. Uma vez quebrado pela morte, esse pacto do guerreiro, que protege com o dever as mil disposições do homem livre, estabelece-se a funda divergência com a repetição da honra e do brio de servir. De facto, as pessoas servem para não se estranharem como criaturas sem prisões; buscam-nas para poder considerar a vida como lógica da sua vontade. Mas o desejo, que cintila na obscuridade da alma, é alguma coisa de sedicioso e que não pertence a qualquer sucesso ou glória."
Agustina Bessa-Luís, Sebastião José, 3ª ed., Lisboa: Guimarães Editores, 2003, p. 228.
No comments:
Post a Comment