"perguntou por onde vai
a narração do secretário da corte
no
caderno
de bolso das ideias chuvosas
de Lisboa
eu tinha vindo de onde
era o outro lado, do Verão
polifónico das palavras
metade de mim debulhava
a fruta doce dos capítulos
a outra metade
ramificava num jogo de memórias
num aturado tratado sobre a respiração
de quem espera no silêncio do mundo
continuou fora de mim o texto
caminho provisório círculo síntese imperfeita
de lugar
qual o quadro concreto desta tristeza?
a minha noção de melancolia é
uma notícia naufragada um verso detido
na alfândega
nevoeiro muro branco vento que reúne
a areia na véspera das palavras
marinheiro ao largo da derrota ou
outra coisa definitiva o rigor
metafísico de um cigarro
frente ao sentido vulnerável
dos dias
escrevo antes que escureça alguém
veio passear-se no silêncio europeu da praça
chapéu inclinado sobre a orelha esquerda
astrónomos olhavam o extracto do céu de Setembro"
Miguel-Manso, Contra A Manhã Burra [cortado], 2ª ediç., Lisboa: Mariposa Azual, 2009, pp. 70-71.
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