"Calaram-se todos por um momento. A marquesa, porém, interrompendo o silêncio, perguntou-lhe bruscamente:
- Acredita na virtude?
- Sim, acredito, sob a condição única de ela existir dentro de nós mesmos, do contrário, não, pois ficaria representando apenas um preconceito ou uma imposição, e nunca uma qualidade. Refiro-me, é claro, à virtude em geral.
- E na da mulher?
- Essa é mais frágil, mais problemática - retorquiu Álvaro por entre um sorriso de dúvida - reside toda nos nervos...
- Como assim?
- É que são raríssimas as mulheres absolutamente virtuosas.
- Não admite pois a honestidade na mulher?
- Conforme a acepção da palavra for tomada; se fala na honestidade convencional, dir-lhe-ei que existem efectivamente virtuosas, para os outros; doutra forma limito-me a duvidar.
- E porquê?
- Pela simples razão de que no mundo existem três ordens de mulheres e todas elas criminosas no amor. As conscientes da falta, aquelas a que o temperamento perde, e as grandes amorosas, nas quais reside um sentimento estranho - a consciência na inconsciência. Ora são estas para mim as únicas simpáticas, honestas e dignas de serem amadas."
António de Albuquerque, Marquês da Bacalhoa, Lisboa: IN-CM, 2002, pp. 188-189.