" - Então não acredita no destino? Num poder que reina acima de nós e que tudo orienta para nosso bem?
- Não se trata, aqui, das minhas convicções, nem é sítio para eu lhe expor como procuro tornar de algum modo concebíveis coisas que são incompreensíveis para todos nós. A questão está apenas em saber quais são as concepções que contribuem para o nosso bem. O tecido deste mundo é feito de necessidade e de acaso. A razão humana coloca-se entre ambos e sabe dominá-los: trata o necessário como fundamento da sua existência e é capaz de orientar, conduzir e utilizar o acidental. Só na medida em que ela permanece firme e inabalável é que o homem merece ser chamado um deus da Terra. Ai daquele que se habitua, desde a juventude, a querer encontrar no necessário algo de arbitrário, que gostaria de atribuir ao acidental uma espécie de razão, obedecer à qual seria até uma religião! Significa isso outra coisa que não seja renunciar ao seu próprio entendimento e dar todo o lugar às suas tendências? Imaginamos que somos crentes, porque nos vamos arrastando sem reflectir, nos deixamos determinar por agradáveis acasos e, por fim, damos ao resultado duma vida assim oscilante o nome de orientação divina."
Johann W. Goethe, Os Anos de Aprendizagem de Wilhelm Meister, vol. I, trad. João Barrento, Lisboa: Relógio D'Água Editores, 1998, pp. 98-99.
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