Saturday, December 30, 2017
MESO
"NUNCA VIMOS DEUS
Mas deve estar no meio de nós
no meio dos que estão sós
no meio dos céus;
dos seus.
No meio dos rios vazios.
Num vale sempre igual.
Nas rosas majestosas
que há nas covas.
Por vezes, quando amanhece,
e um de nós se lembra e esquece
diz o que viu e o que fez
durante a noite, uma vez,
e pede a Deus pelos seus
que os visite e que os avise;
Deus não responde ao pedido
como um Deus desconhecido
ou tão antigo que é tido
como um jazigo
vendido.
Nós nunca vimos Deus.
(E nem sequer somos ateus...)
Só sabemos que ama os seus;
patrulha os céus e as estradas
em carruagens geladas.
Cansado dos fariseus
perseguindo os maniqueus
com fama de não ter chama.
Sabemos que fala e que responde
(só não sabemos é onde)
que se reúne e perscruta
que se inflama e que conclama
e que disputa e que luta
que se exalta e que se agita
(às vezes pula e até grita...)
e que conversa e que chama
só não sabemos quem
ou com quem
ou se alguém
o ouviu
ou viu
ou escuta
ou ama
ou trama.
Não é bem disputa.
É só uma evidência astral
astuta, bruta,
puta.
Nós nunca vimos Deus.
(Não tem mal...)
Porque cada um
dos mil véus
que há nos céus
tem mil véus;
tem mil réus."
António Ladeira, in Piolho, Revista de poesia, n.º 24, dezembro de 2017, pp. 9-10.
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