Tuesday, February 27, 2018

ALUMIAR


"A alumiá-lo, não havia senão o alvor azulado que o fantasma ia esparzindo numa área de alguns passos. Inútil prudência a sua, porém! Bem adivinhava que tantas cautelas impacientavam a companheira. E, tendo ele próprio grande pressa de chegar, não sabendo embora aonde, fechou os olhos. Começou a correr, sempre levado pela mão espectral da que parecia ir voando. E o caso é que ou se desviavam dele, agora, as arestas das penhas e os monstruosos caules das árvores, ou também já ele os varava, como se também o seu corpo houvera deixado de ser matéria. Demais, já se nem sentia trilhar ou roçar o chão. Era como se fosse correndo, pairando, ao de cima do solo."

José Régio, O Príncipe com Orelhas de Burro, 2.ª ed., Lisboa: Editorial Inquérito, 1946, pp. 44-45. 

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