Monday, November 28, 2011

ÁGUAS 1


" - O que é essencialmente repugnante? - disse. - Pressupõe-se teoricamente que o amor é qualquer coisa ideal, elevada, mas na prática o amor é uma coisa repugnante, suína, até dá nojo e vergonha falar dele, lembrá-lo. Como é nojento e vergonhoso, deveríamos entendê-lo como tal. Mas não, faz-se de conta que o nojento e o vergonhoso é o belo e o elevado. Quais eram os primeiros indícios do meu amor? Era entregar-me aos excessos animais, sem me envergonhar e, sabe-se lá porquê, orgulhando-me desses excessos físicos, sem pensar minimamente na vida espiritual dela nem, sequer, na sua vida física. Eu espantava-me, não percebia donde provinha a nossa raiva, mas o problema era perfeitamente claro: a raiva não era mais do que o protesto da natureza humana contra o animal que a oprimia."

Lev Tolstói, A Sonata de Kreutzer, trad. Nina Guerra e Filipe Guerra, Lisboa: Biblioteca Editores Independentes, 2010, p. 55.

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