Friday, May 31, 2019

VOLÚVEL




"Sabe-nos bem a beleza
porque a sua dança volúvel 
é o ritmo das nossas vidas.
Gostamos da sabedoria
porque não temos sempre de a acabar. 
No eterno tudo está feito e concluído, 
mas as flores da ilusão terrena
são eternamente frescas, 
por causa da morte. 
Irmão, recorda isto, e alegra-te."

Rabindranath Tagore, O Coração da Primavera, 3.ª ed., trad. Manuel Simões, Braga: Editorial A.O., 1990, pp. 33-34. 

Thursday, May 30, 2019

LUGAR ESCASSO




"À noite deixavas que as sombras tingissem
os teus passos. Que o silêncio 
golpeasse o teu rosto com a cinza muda
das palavras. Estavas pálido entre 
paredes e as pústulas emplumadas. 
Para lá das janelas um abismo
entardecia a curva das aves
a exacta caligrafia de uma árvore
o nome minucioso
desse lugar escasso
e fulminante."

Jorge Velhote, Âmago, Edições Sem Nome, 2018, p. 39. 

Wednesday, May 29, 2019

DE OUTROS DIAS




"as imagens do dia eram fotografias de outros dias
os bancos de manhã depois de uma noite de chuva
e a mesa vazia onde se acumularam folhas
e uma presença negada e as casas pedra
a pedra desconstruídas e a tua última noite no meio deles
e no meio das sirenes à medida que a noite avança"


Tatiana Faia, Um Quarto em Atenas, Lisboa: Tinta-da-China, 2018, p. 86. 

Tuesday, May 28, 2019

VIGÉSIMO TERCEIRO ANO



"Quem é que assim nos virou, de tal forma
que, em tudo o que façamos, estamos sempre na atitude
de alguém que parte? Como esse que parte, 
no alto da última colina que mais uma vez
lhe mostra todo o seu vale, se volta, pára, se demora -,
assim vivemos nós, sempre a despedir-nos."


Rainer Maria Rilke, "As Elegias de Duino" (oitava) , in Poemas, 5ª ed., trad. Paulo Quintela, Porto: Asa, 2003, p. 190. 

Monday, May 27, 2019

GENITRIX



"Segundo o embaixador veneziano Dandolo, Catarina terá bebido uma poção de chifre de unicórnio esmagado e marfim com água. Outra receita selecionada dos alquimistas antigos era uma mistura do leite de égua, sangue de coelho e urina de ovelha. Alguns eram da opinião de que o sangue de uma lebre e a pata esquerda traseira de uma doninha misturadas com vinagre resultariam às mil maravilhas. Por debaixo das roupas, Catarina usava um cinto de pelo de cabra, feito por uma bruxa e empapado em leite de burra. Pendurado neste, para «garantir» o sucesso, encontravam-se alguns amuletos, tais como o dedo médio de um feto nascido dois meses antes do tempo. À volta o pescoço usava um amuleto que continha as cinzas de uma enorme rã com vista a estimular o nascimento de uma criança do sexo masculino."

S.A.R. a Princesa Michael de Kent, A Serpente e a Lua, trad. Sofia Sá da Bandeira, Porto: Livraria Civilização Editora, 2006, p. 227. 

Sunday, May 26, 2019

EUROPA




"Portas cerradas mesmo aos deuses.
Postigos por estrear.
O sol, de cal. 

Ao render da luz as mães
soltam os filhos à lua
nos quintais."

Luiza Neto Jorge, Poesia, Lisboa: Assírio & Alvim, 1993, p. 264. 

Saturday, May 25, 2019

A ETERNIDADE


"Os filósofos antigos Aristóteles e Platão falavam do conhecimento da eternidade e, com ela, da verdade, sem existência de palavras. Platão chamava-lhe arrhèton, que significa «o indizível» e Aristóteles aneu logou, que significa «sem fala» ou «sem palavras». Lá, onde acaba o vocabulário, afirmavam os filósofos, abre-se a possibilidade de compreender imediatamente as grandes verdades."

Erling Kagge, Silêncio na Era do Ruído, trad. Miguel de Castro Henriques, Lisboa: Quetzal, 2017, p. 93.

Thursday, May 23, 2019

NOÇÕES



"Na escola, aprendi alguma coisa sobre as ondas sonoras. O som é uma realidade material e pode ser medido em decibéis, embora achasse pouco satisfatório medir o som com os números de uma tabela. O silêncio é sobretudo uma ideia. Uma noção. O silêncio que nos rodeia pode conter muito, mas o tipo de silêncio mais interessante é o interior. Um silêncio que cada um de nós tem de criar. É por isso que já deixei de tentar criar um silêncio absoluto à minha roda. O silêncio que procuro é o silêncio interior."

Erling Kagge, Silêncio na Era do Ruído, trad. Miguel de Castro Henriques, Lisboa: Quetzal, 2017, p. 35. 

Wednesday, May 22, 2019

ESPERA




"Sempre que não posso caminhar, subir a uma montanha ou navegar para longe do mundo, aprendi a desligar-me dele. 
Levei algum tempo a aprender. Somente quando percebi que tinha uma necessidade primordial de silêncio fui capaz de partir à sua procura - e, então, soterrado sob uma cacofonia de ruídos de trânsito e pensamentos, música e máquinas, iPhones e carros limpa-neves, lá estava ele à minha espera. O silêncio."


Erling Kagge, Silêncio na Era do Ruído, trad. Miguel de Castro Henriques, Lisboa: Quetzal, 2017, p. 9. 

Tuesday, May 21, 2019

LEITURA



"Numa maravilhosa passagem acerca da grandiosidade da leitura, escreve: « creio que devemos ler apenas o tipo de livros que nos fere e nos apunhala. Se o livro que estamos a ler não nos desperta com uma pancada na cabeça, para que estarmos a ler? Precisamos dos livros que nos afetam como se um desastre se tratasse, que nos causam profundo pesar, como a morte de alguém a quem amámos mais que a nós mesmos, como se fôssemos exilados em florestas, longe de toda a gente, como um suicídio. Um livro tem de ser um machado para o mar gelado dentro de nós»."

Nicholas Murray, Kafka, trad. Sofia Ribeiro, Mem Martins: Publicações Europa-América, 2006, p. 54. 

Monday, May 20, 2019

PODERES



"E, assim, atingimos estes picos de emoção, não por retórica ou por exaltação, mas ouvindo uma jovem cantarolar para si mesma velhas canções enquanto se baloiça nos ramos de uma árvore; vendo as ovelhas a retouçar pelos brejos; escutando a brisa mansa a suspirar por entre as ervas. A vida na quinta, com tudo o que tinha de absurdo e improvável, é exposta ante os nossos olhos e é-nos dada plena oportunidade de compararmos Wuthering Heights com uma quinta real e Heathcliff com um homem real. Como, poderemos nós perguntar, pode haver verdade ou sensibilidade ou os mais finos matizes de emoção em homens e mulheres que tão pouco se assemelham com o que nós próprios vimos? Mas, ao mesmo tempo que formulamos esta pergunta, vemos em Heathcliff o irmão que uma irmã de génio poderia ter visto; dizemos que ele é impossível, mas, não obstante, nenhum outro jovem tem na literatura uma existência mais plena do que ele; o mesmo acontece com as duas Catherines; nunca as mulheres puderam sentir ou agir como elas, dizemos nós. Mesmo assim, elas são as mulheres que mais simpatia inspiram na ficção inglesa. É como se Emily Brontë pudesse desfazer tudo o que reconhecemos nos seres humanos e preencher essas transparências irreconhecíveis com uma tal ânsia de viver que elas transcendam a realidade. E, assim, detém o mais raro de todos os poderes - conseguir libertar a vida da sua dependência dos factos; revelar com algumas pinceladas a alma de um rosto, tornando o corpo desnecessário; ao falar do brejo, fazer o vento uivar e o trovão ribombar."

Virginia Woolf, "Jane Eyre and Wuthering Heights", in Ensaios Escolhidos, trad. Ana Maria Chaves, Lisboa: Relógio D'Água, 2014, pp. 109-110. 

Sunday, May 19, 2019

O HOMEM LEITOR




"Apesar de tudo, podemos facilmente convocar uma imagem que faça jus ao homem livresco e nos suscite um sorriso à sua custa. Imaginamos um ser pálido e esquálido, num quarto de vestir, perdido em especulações, incapaz de tirar a chaleira da trempe ou de falar com uma senhora sem corar, na total ignorância das últimas notícias, embora versado em catálogos de alfarrabistas, em cujas salas obscuras passa as horas da claridade - uma personagem deliciosa, sem dúvida, na sua complicada simplicidade, mas sem a mínima semelhança com a outra para quem dirigíamos a atenção. Porque o verdadeiro leitor é essencialmente jovem. Um jovem possuidor de uma intensa curiosidade: cheio de ideias; de mente arejada e comunicativo; alguém para quem a leitura é mais como um enérgico exercício ao ar livre do que horas de estudo entre quatro paredes; avança pela estrada principal e escala montanhas até a atmosfera ser quase rarefeita demais para conseguir respirar; para ele, esta não é de modo algum uma busca solitária."

Virginia Woolf, "Hours in a Library", in Ensaios Escolhidos, trad. Ana Maria Chaves, Lisboa: Relógio D'Água, 2014, p. 64. 

Friday, May 17, 2019

EXPOSTO



"Tu que existes exposto ao que os dias te trazem, o que é ser
Alguém? O que é não ser Ninguém? O humano é o sonho de 
uma sombra. 
Mas quando chega o esplendor dispensado por um deus, há 
uma luz brilhante entre os homens e a vida torna-se mais doce."



Píndaro, "Para Aristómenes de Egina, vencedor na luta", in Odes Píticas, VIII, trad. António de Castro Caeiro, Lisboa: Prime Books, 2006, p. 110. 

Thursday, May 16, 2019

PÉS VELOZES




"E assim não te esqueças, de pôr o deus acima de tudo como
causa de todas as coisas e amar Carroto como o mais
excelente dos amigos, quando fores cantado no jardim de Afrodite. 
Ele não trouxe consigo a Alegação, filha de Epimeteu, 
Compreender-tardio, quando chegou ao palácio dos Batidas,
que governam por direito; hospedado junto à fonte de 
Castália, depôs antes o prémio de honra nos teus cabelos pela
vitória na corrida de carros;
deu doze voltas ao recinto sagrado para corridas de pés
velozes com as suas rédeas intactas. 
Não quebrou coisa alguma do seu forte equipamento. Mas
ficaram agarrados ao carro todos os adornos fabricados pelas
mãos hábeis dos mestres carpinteiros e que ele próprio trouxe
através da encosta de Crisa até ao vale profundo do deus. 
Agora, protegido pelo telhado de ciprestes do templo, está ao
lado da estátua talhada a partir de um único tronco de árvore
que os cretenses, portadores de arcos, erigiram, na casa de
Parnasso."


Píndaro, "Para Arcesilau de Cirene, Vencedor no Carro", in Odes Píticas, V, ., trad. António de Castro Caeiro, Lisboa: Prime Books, 2006, p. 86. 

Wednesday, May 15, 2019

CONDUZIR




"É dos deuses que chegam todos os estratagemas com vista às
excelências mortais, é deles que nascem os sábios, os fortes
de mãos e os que têm o poder da linguagem. Se desejo louvar 
este homem, é porque tenho a esperança de não arremessar 
o dardo de faces de bronze, que eu brando com meu punho, 
para fora do recinto da prova, mas de o lançar para o longe
que vence os meus adversários.
Se é o tempo todo que nos conduz numa bênção e nos faz 
adquirir tudo o que possuímos, que faça também esquecer os
esforços."

Píndaro, "Para Hierão, Vencedor na corrida de carro", in Odes Píticas, I, 3.ª estr., trad. António de Castro Caeiro, Lisboa: Prime Books, 2006, p. 25. 

Tuesday, May 14, 2019

BÍTON


"Considera-se geralmente que o sorriso arcaico resulta da dificuldade que ao princípio os escultores encontravam ao querer articular a forma da boca com as maçãs do rosto. Mas mais tarde, quando o aperfeiçoamento da sua técnica lhes permitia superar essa dificuldade, conservavam o sorriso por terem reconhecido que esse animava toda a expressão do rosto. Seja como for, nos Kouroi o sorriso pertence à essência da obra. É um sorriso que está não só na face mas que, de cima para baixo, anima todo o corpo. Um sorriso que estabelece essa «consciência radiosa do próprio eu» que o Kouros é."

Sophia de Mello Breyner Andresen, O Nu na Antiguidade Clássica, 3.ª ed., Lisboa: Caminho, 1992, pp. 40; 42. 

Monday, May 13, 2019

MARINHO




"Ó criança, a quem junto à pele do animal marinho, 
Do que ama os rochedos, o espírito mais
Se agarra, une-te a todas as cidades, 
Louvando o presente, 
benevolente
E pensa de outro modo, num outro tempo."


Friedrich Hölderlin, Fragmentos de Píndaro, trad. Bruno C. Duarte, Lisboa: Assírio & Alvim, 2010, p. 17. 

Sunday, May 12, 2019

GENESIS




"Não dando mostras de notar a sua presença, Mani prosseguiu o discurso:
- ... no começo do universo, separados um do outro, existiam dois mundos: o mundo da luz e o das trevas. Nos Jardins de Luz estavam todas as coisas desejáveis, nas trevas residia o desejo, um desejo poderoso, imperioso, bramidor. E de súbito, na fronteira dos dois mundos, deu-se um choque, o mais violento e mais terrificante que o universo conheceu até hoje. As partículas de luz misturaram-se então com as Trevas, de mil modos diferentes, e foi assim que surgiram todas as criaturas, os corpos celestes e as águas, e a natureza e o homem..."

Amin Maalouf, Os Jardins de Luz, trad. G. Cascais Franco, Lisboa: Difel, 1992, p. 86. 

Friday, May 10, 2019

ESCALAR




"Se da justiça o muro, 
O alto, ou a sinuosa ilusão eu
Escalo, e assim, a mim mesmo me
Circunscrevendo, me vivo
Para fora, quanto a isso
Tenho um duplo sentido
O ânimo para o dizer com precisão."


Friedrich Hölderlin, Fragmentos de Píndaro, trad. Bruno C. Duarte, Lisboa: Assírio & Alvim, 2010, p. 29.

Thursday, May 9, 2019

PRESIDIR




"Era ele, Alexandre, que presidia ao curso do tempo. Pois não é verdade que os astrónomos de Babel haviam elegido a data da sua morte para início da nova era?"

Amin Maalouf, Os Jardins de Luz, trad. G. Cascais Franco, Lisboa: Difel, 1992, p. 50. 

Wednesday, May 8, 2019

VELOCIDADE




"O teu corpo aparece e desaparece
com a velocidade do ar
num incêndio. Ou num eclipse.
É a solidão de um homem
sentado diante do mar. E perguntas:
o que vê ele na escuridão da noite
se chove intensamente?
E aguardas que na garganta
se dissolva o que não escutas."

Jorge Velhote, Âmago, Edições Sem Nome, 2018, p. 42. 

Tuesday, May 7, 2019

A FLOR DO CAMPO



"Mais do que a amargosa pétala mastigada, 
seu aspro odor e seiva azeda, 
a lembrança antiga das camadas do sono:
há muito tempo, foi depois da missa,
eu e mais duas tias num caminho, as pernas delas
na frente, com meia grossa e saias.
No ar os cheiros do mato, as palavras cordiais, 
o céu pra onde íamos, azul, 
conforme as palavras de Nosso Senhor, 
os lírios do campo, olhai-os,
a flor do mato, a infância."


Adélia Prado, Bagagem, Lisboa: Cotovia, 2002, p. 118. 

Monday, May 6, 2019

AS COLINAS DO CÉU


"Somos fiéis. Olhamos para a frente e para trás (sentidos simbólicos que designam a alternativa das duas direcções ou o percurso vivencial) (ó Rilke), vários percursos, todos unos e separáveis, históricos. Hölderlin, Hölderlin entre outros, existenciais, pré-existenciais (o que pode ser, que será de qualquer modo, ou de tal modo, mas que late, é latente, está no fundo.) Mas o fundo é o todo, portanto também a superfície. Isto, o ser fiel: ser total: reter e libertar. Devolver à terra o que é da Terra, e às colinas do Céu o que é das suas serpentes proféticas."

Fiama Hasse Pais Brandão, "Visões Mínimas" in Obra Breve, Lisboa: Ed. Teorema, 1991, p. 217. 

Sunday, May 5, 2019

CASA




"Casas erguidas onde moram fugazes
Habitantes da terra, inflamados no coração
Que a outros se dedica. Casas devolutas e 
Cegas, lugares onde se vive tacteando
O ar e vendo por janelas reduzidas
Um pouco do mundo. As árvores
Ficam à porta e dão concertos de brisa
E trinados. As árvores são antigas e novas como
As casas. Mas estas são mudas: apenas
Circulam as palavras de quem lá vive, 
O trânsito flui, não há escadas rolantes, 
Esse fecundo silêncio das casas
Decora-as com beleza e ritmo.
Algumas vezes se morre lá dentro. 
A maior parte das vezes vive-se."


Maria Teresa Dias Furtado, Onde o Poeta mora, Braga: Poética Edições, 2019, p. 39. 

Saturday, May 4, 2019

PARNASO




"Nunca mais meus olhos os tornarão a ver? Ai! Não vos tornará a encontrar
Nos mil caminhos da Terra vicejante quem vos procura, 
Ó figuras a deuses semelhantes? E foi por isso que entendi a linguagem,
A lenda a vosso respeito, para que a minha alma, sempre de luto, 
Antes do tempo desça até às vossas sombras? 
Mas para mais próximo de vós, onde os vossos bosques ainda crescem, 
Para o Parnaso, quero ir; e quando a escuridão do carvalho, 
Brilhando, a fonte de Castália vier ao meu encontro, enquanto ando errante, 
Quero, de uma taça envolta no perfume de flores, água
Misturada com lágrimas ali derramar, sobre o verde que germina, para que 
Se torne para vós, todos vós que dormis, uma oferenda aos mortos."


Friedrich Hölderlin, "O Arquipélago", in Elegias, trad. Maria Teresa Dias Furtado. Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, p. 105. 

Friday, May 3, 2019

PÓLIS




"Diz-me, onde está Atenas? Ter-se-á desfeito em cinzas, 
Sobre as urnas dos mestres, a tua cidade, a que mais amas,
Junto às praias sagradas, ó Deus de luto!
Ou existirão ainda vestígios dela para que o navegante, 
Ao passar por ela, a nomeie e se lembre dela?
Não se erguiam ali as colunas e não brilhavam ali
Outrora as figuras dos deuses, no cimo da Acrópole?
Não murmurava ali a voz do povo, agitada como uma tempestade,
Vinda da ágora, e não se apressavam ali as vielas, 
Partindo de joviais portas, a ir ter contigo ao porto abençoado?"


Friedrich Hölderlin, "O Arquipélago", in Elegias, trad. Maria Teresa Dias Furtado. Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, p. 95. 

Thursday, May 2, 2019

ORACULAR



"O senhor, de quem é o oráculo, aquele de Delfos, não diz nem oculta, porém assinala."


Heraclito, Fragmentos Contextualizados, trad. Alexandre Costa, Lisboa: IN-CM, 2005, p. 154. 

Wednesday, May 1, 2019

AROMA



"Eu digo, quando assoma
O astro criador: 
Deus me fizesse um aroma
De alguma pobre flor!

E digo, quando passa
Uma ave pelo ar:
Deus me fizesse a graça
De asas para voar!

Aroma, da janela
Me evaporava eu, 
Me respirava ela
E me elevava ao céu!

E quem, se eu fosse uma ave, 
Me havia de privar
A mim da luz suave
Daquele seu olhar?"


João de Deus, Campo de Flores, 6ª ed., Lisboa: Companhia Editora Portugal-Brasil, s.d., p. 47.