" - Estou a ver - disse ele. - Pensa que estou louco! - E deu uma leve palmada na sua própria testa.- Não, louco não. Infeliz. E quando a infelicidade tem demasiada liberdade para escolher o seu caminho, claro, pode exercer uma grande pressão sobre a razão.Ele permaneceu em silêncio por algum tempo, e depois abruptamente:- Eu não sou infeliz! Sou imensamente feliz. Não acreditaria se lhe contasse a satisfação que me dá sentar-se aqui e contemplar aquele velho Hermes desgastado pelo tempo. Antes costumava ter medo dele; o seu cenho costumava lembrar-me um velho padre de pestanas hirsutas que me deu aulas de Latim e olhava para mim com um ar ameaçador quando eu gaguejava a ler Virgílio. Mas agora parece-me a coisa mais amigável e prazenteira do mundo, e sugere os cenários mais encantadores. Consigo imaginá-lo com seus lábios franzidos a embelezar um velho jardim romano há dois mil anos. Viu os pés em sandálias palmilhando as alamedas, e as cabeças coroadas de rosas inclinar-se sobre o vinho; conheceu as velhas festividades e os velhos rituais, os velhos crentes e os velhos deuses. Quando me sento aqui e ele fala comigo, no seu modo indolente, e descreve-me tudo! Não, não, meu amigo, eu sou um homem extremamente feliz!"
Henry James, "O Último dos Valerii", in Daisy Miller e outros contos, trad. Manuel Abrantes, Lisboa: Nova Vega, 2008, pp. 28-29.
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