Thursday, March 15, 2012

LIBERTAS


"Neste instante, de resto, vê-os, mas eles não a vêem a si. Odeio com todas as minhas forças esta servidão que pretendem impor-nos. Lastimo o homem por ter de sofrer essa condenação, por geralmente não se lhe poder eximir, mas não é a dureza da pena que me dispõe em seu favor, é sim o vigor do seu protesto, e só isso. Sei que perante um forno de fábrica, ou diante de uma dessas máquinas inexoráveis que impõem todo o dia, a alguns segundos de intervalo, a repetição do mesmo gesto, ou por toda a parte sob as ordens mais inaceitáveis, ou na prisão, ou à frente de um pelotão de fusilamento, a gente ainda pode sentir-se livre, mas não é o martírio sofrido que cria essa liberdade. Uma vida livre é uma lembrança passada a quebrar perpetuamente as correntes que nos tolhem, e para que isso seja possível, preciso é que as correntes não nos esmaguem, como fazem a muitos daqueles de que fala. Mas a liberdade é também, e talvez seja o que melhor a define humanamente, a mais ou menos longa, mas sempre maravilhosa, sequência de passos que ao homem não acorrentado é permitido dar."
André Breton, Nadja, trad. Ernesto Sampaio, 2ª ed., Lisboa: Editorial Estampa, 2010, p. 51.

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