Tuesday, May 28, 2013

17 ANOS



"- Confesso que continuo a achar tão imbecil e tão infernal ir para o escritório na segunda-feira como sempre achei e hei-de achar - declarou John.
- Passar uma pessoa os melhores anos da sua vida sentado num banco, desde as nove até às cinco, a garatujar coisas em livros de registos! É uma forma bem idiota de passar a única vida que temos, não achas? Ou estarei a sonhar? Deu uma volta na relva e ergueu os olhos para Linda. - Ora, diz-me lá: qual é a diferença entre a minha vida e a de um vulgar prisioneiro? A única diferença que lhe encontro é que eu fui voluntariamente meter-me na prisão. E também é certo que nunca me porão em liberdade. É uma situação bem mais intolerável do que a outra. Porque se me tivessem lá metido à força - aos pontapés que fosse - uma vez fechada a porta, ou pelo menos, daí a coisa de cinco anos, eu poderia ter-me resignado com a minha situação e começado a interessar-me pelo voo das moscas ou pela contagem e variação dos passos do guarda e outras coisas do género. Mas, assim, pareço-me com um insecto que, de livre vontade, se atira para dentro de um quarto. Vou de encontro às paredes e às janelas, bato com as asas no tecto, faço tudo neste mundo, excepto voar dali para fora. E, entretanto, não deixo de pensar como essa mariposa, essa borboleta, ou lá o que é: Ai, a brevidade da existência!Só disponho de um dia e lá fora espera-me o vasto e perigoso jardim, onde tudo se encontra por descobrir e explorar."


Katherine Mansfield, "Na Enseada", in O "Garden-Party", trad. Virgínia Motta, 2ª ed., Lisboa: Portugália Editora, s.d., pp. 57-58.

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