Friday, June 28, 2013

AD AMOREM, AD MORTEM, RUMO A ALEXANDRIA


"Entretanto, logo que se fez noite, uns piratas, ao saberem que uma moça tinha sido sepultada com inúmeras riquezas e que com ela jazia também uma grande quantidade de adornos femininos, muita prata e muito ouro, dirigiram-se ao túmulo e arrombaram as portas da sepultur; entraram lá dentro, apoderaram-se de tudo o que era de valor e viram que Ântia estava viva. Pensando que também ela lhes daria um lucro chorudo, levantaram-na e queriam levá-la com eles. A moça, porém, atirou-se-lhes aos pés e suplicou nestes termos: «Meus senhores, quem quer que vocês sejam, peguem nestes adornos, em tudo o que aqui está e fiquem com tudo o que foi sepultado comigo, mas mantenham-se afastados de mim. Eu estou consagrada a duas divindades: ao Amor e à Morte. Deixem-me continuar devota delas. Por favor, pelos deuses da vossa própria pátria, não me façam encarar a luz do dia, porque eu sou uma desgraçada que apenas sou digna de noite e trevas». Com estas palavras ela não conseguiu convencer os piratas; eles tiraram-na do túmulo, dirigiram-se ao mar, meteram-se no seu barco e rumaram em direcção a Alexandria. Durante a viagem, cuidaram dela e procuraram consolá-la. Ao meditar na infelicidade em que se via novamente, [Ântia] desfez-se em lamentos e queixumes. «Outra vez», disse ela, «piratas e mar; aqui estou eu outra vez como prisioneira; mas agora é ainda mais doloroso, porque me falta a companhia de Habrócomes. Que terra é que me irá receber? Que espécie de homens eu irei lá encontrar? Oxalá eu nunca mais veja nem Méris, nem Manto, nem Perilau, nem a Cilícia. Oxalá que para onde eu vá possa encontrar o túmulo de Habrócomes. É só o que eu peço!» À medida que ia falando, as suas lágrimas não paravam de correr; também não queria beber nem comer, mas os piratas obrigavam-na."
Xenofonte de Éfeso, As Efesíacas - Ântia e Habrócomes, trad. Vítor Ruas, Lisboa: Edições Cosmos, 2000, L. III, pp. 38-39.

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