"Ergueram a cruz e amarraram-no a ela, atando-lhe as mãos e os pés com cordas, pois era este o hábito deles na crucificação. Depois foram-se embora, deixando-o ali suspenso, cientes de que ele lá ficava atado em segurança. Depois de ter olhado fixamente para o Sol, Habrócomes virou-se para o leito do Nilo e disse: «Ó deus de todos os deuses, o mais misericordioso para todos os humanos, tu que és senhor do Egipto, que deste a conhecer a terra e o mar a todos os seres humanos, se Habrócomes cometeu algum crime, que eu morra miseravelmente e, se for possível, que receba uma punição ainda maior que esta; mas se eu fui atraiçoado por uma muher perversa, que estas águas do Nilo não fiquem manchadas com o sangue do corpo de quem foi morto injustamente, nem tu assistas a uma tal cena: ver um homem que nada fez de mal a morrer nas tuas águas». Foi esta a súplica que ele lhe fez. E o deus compadeceu-se dele. Uma rajada de vento surgiu então repentinamente, abateu-se sobre a cruz e desmoronou o terreno do precipício onde estava implantada; Habrócomes caiu à água e foi arrastado sem que a corrente o pusesse em perigo, nem as cordas o mobilizassem, nem ainda os seres marinhos lhe fizessem mal; a corrente apenas se limitou a conduzi-lo. Arrastado até às Embocaduras do Nilo, chegou ao lugar em que estas confinavam com o mar. Aí os guardas de serviço agarraram-no e, como um fugitivo da justiça, levaram-no à presença do Governador do Egipto."
Xenofonte de Éfeso, As Efesíacas - Ântia e Habrócomes, trad. Vítor Ruas, Lisboa: Edições Cosmos, 2000, L. IV, pp. 46-47.
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