"- Quer dizer que sou um idiota, visto que sofro, estou descontente e desgosta-me a maldade humana.
- Não deve pensar assim. Se reflectir, compreenderá a significação de tudo o que é exterior, tudo o que nos inquieta. Há que tentar compreender a vida; nisso está o verdadeiro bem. - Compreender a vida... - replicou Ivan Dmitrich, franzindo o sobrolho. - O exterior, o interior... Perdão, mas não o compreendo. A única coisa que sei é que Deus me criou com sangue quente e nervos, como está a ouvir! O tecido orgânico, se é capaz de vida, deve reagir a qualquer excitação. E eu reajo! À dor respondo com gritos e lágrimas; à maldade, com indignação; à vilania, com asco. Quanto a mim, isto é, na realidade, aquilo a que se chama vida. Quanto mais débil é o organismo, menos sensível se mostra e mais frouxamente resiste à excitação. E quanto mais elevado, tanto mais sensível e enérgica é a sua reacção à realidade. Como pode ignorá-lo? É você médico e não sabe umas coisas tão elementares! Para desprezar a dor, estar sempre satisfeito e não se preocupar com coisa alguma há que atingir esse estado - e Ivan Dmitrich apontou para o mujique obeso, transbordante de gordura, ou então ter-se identificado com a dor até ao extremo de perder qualquer sensibilidade em relação a si próprio; ou seja, por outras palavras, deixar de existir. Perdoe-me, não sou sábio nem filósofo - prosseguiu, irritado - e não compreendo nada destas coisas. Não me sinto em condições de raciocinar."
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