Monday, November 2, 2020

O ABISMO

 



" «Ah!, ressuscita-ma,» exclamou Walter, arremessando-se aos pés do feiticeiro. «Oh!, se na verdade és capaz de realizar isso, satisfaz a minha ardente súplica; se algum resquício de sentimento humano lateja no teu peito, deixa que as minhas lágrimas te persuadam: ressuscita a minha amada para mim; e sempre abençoarás o teu acto, e verás que foi uma boa obra.»
«Uma boa obra! Um acto abençoado!» - retorquiu o feiticeiro, com um sorriso de escárnio; «para mim não existe bem nem mal, pois o meu desejo é sempre o mesmo. Só vocês conhecem o mal, vocês que desejam aquilo que não deviam desejar. É verdade que tenho poderes para ressuscitá-la para ti; contudo, reflecte bem se isso resultará na tua felicidade. Pondera também quão profundo é o abismo entre a vida e a morte; sobre ele, o meu poder pode construir uma ponte, mas nunca será capaz de preencher o precipício assustador.»"


Johann Ludwig Tieck, "Não Acordes os Mortos", in Histórias de Vampiros, trad. Margarida Periquito, Lisboa: Relógio D' Água, 2008, pp. 53-54. 

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