"Oiço a secreta respiração da rua.
Uma mancha de sol espalhou-se no papel
e ensina-me a não acumular a vida.
Mas depressa se afasta essa nódoa de luz.
Ou será que regressa?
Não sei, só sei que existe a rua
com seus leves rumores
de energia dispersa.
E que a memória chega e desaparece
carregada de dor, traindo
a natureza.
O tempo consumiu os sentimentos
e só o ar percorre
o pensamento vão de que algo permanece:
a ilusão da beleza, o frágil monumento da palavra,
o trabalho da terra que nasce de eu olhar
a água proibida.
Oh, as flores da paciência
e da paixão
mortas sobre a mesa.
Alimentos do fogo no mover da mão
reflexos e refluxos da pobreza
de Deus
na minha vida."
Armando Silva Carvalho, "Os Elementos", in Verbo - Deus Como Interrogação na Poesia Portuguesa, Lisboa: Assírio & Alvim, 2014, pp. 170-171.
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