Tuesday, October 30, 2018

PASSAGEM



"Também na arte não pode haver lugar para qualquer justificação moral. Ela é como é, um fogo criativo que a um só tempo constrói e destrói. Que traz consigo os princípios da sua própria justiça, um jogo intencional que corre da obra realizada e a realizar ao seu autor e, deste, como quem governa e reconhece o acordo e o desacordo de um magoado processo, a uma harmonia que se estabelece sobre a discordância, sobre os veios por onde corre a tinta ou os vincos que se acentuam após a passagem de colorida mancha. O resultado é idêntico ao de uma peregrinação que tem por fim o ilimite de uma porta dos mortos que a cada momento se transpõe, mesmo quando foi cautelosamente tapada pela folha de uma engrossada parede."

João Miguel Fernandes Jorge e Pedro Calapez, O Próximo Outono, Lisboa: Relógio D'Água, 2012, pp. 48-49. 

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