Friday, October 12, 2018

UM VENTO DOLENTE



"Uma rosa sepultada no verso, 
O verso como uma rosa impossível. 
Eu vejo o teu rosto
Atravessado por todas as guerras, 
A devastação, um vento dolente
Que traz a memória imensa
De todos, todos os mortos. 

Falas-me da solidão
De um homem que, dia a dia, 
Contemplou a sua morte, 
Até nos cumes incendiados do amor;
Falas-me do futuro primordial
Para onde não há regresso, 
A esperança irrecuperável;
Falas-me dessa manhã
Em que o mundo não emergiu da noite, 
Não voltou ao tempo, 
Um mundo que não se retomou; 
Falas-me da tentação do choro
Nas nascentes da tinta, 
Um choro que suavemente te chama, 
Um choro, um abandono, poema, 
O aqui, onde, por fim, 
Num fruto puríssimo, 
A dor se encontra com a voz."

Nuno Rocha Morais, Galeria, Porto: Edições Simplesmente, 2016, p. 97. 

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