"É que, se interpretar é julgar, o julgamento é o lugar do próprio efémero, pois não saberemos como realizar tal acção, nem poderemos julgar tudo e para sempre. Assim, desde as origens estóicas e talmúdicas, a hermenêutica tornou-se na ciência do instável, ou seja, a ciência que inclui a ausência das suas próprias bases científicas: instabilidade e ausência estas que se reflectem na actual crítica literária.
Por isso, só se pode ler, como se se soubesse ler; só se pode entender, se não desejarmos entender tudo; só se pode julgar, como se não fizéssemos um juízo. Colocados que estamos em tal situação, que sentido poderá fazer, hoje, a actividade crítica, se não o sentido da própria ausência de sentido, que caracteriza a epistemologia deslizante deste fim de século?
Mas tal situação, para a qual a própria palavra crise já não parece ser suficiente, não será, por outro lado, um indício ou sintoma duma já imparável mudança de paradigma nas funções da relação dos homens consigo próprios e, por isso, da linguagem com a própria linguagem?"
E. M. de Melo e Castro, "A Crítica e os limites do literário", in Voos da Fénix Crítica, Lisboa: Cosmos Edições, 1995, pp. 23-24.
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