"Constituirão as palavras o espectro de uma ideia
ou ater-se-á esta a projectar no poema a sombra
da sua passagem pela argamassa da sepultura?
Limpo o quadro, quem decidirá sobre o sentido
das imagens de que se constitui o coração negro
mas violento do discurso? Da desolada metáfora
que nos permite ainda ler em contraluz as sombras
diluídas que o pensamento vai perdendo no seu curso?
Porque, se olharmos para dentro, que placa
oferecemos ao eco das cores que do mundo
em nós as palavras desenham a estranha tessitura?
Toda a espessura resulta de uma perda
que nos inventa interiormente mas
mesmo os cegos recorrem à linguagem
para evocar o segredo de um real
que só lhes é acessível como literatura."
Fernando Guerreiro, Grotesco, Lisboa: Black Son Editores, 2000, pp. 19-20.
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