"O Porto é rude como a rocha onde tem alicerce. Não se esqueça que o Porto é a estação terminal do Douro, a região mais violenta de Portugal. Violenta porque carrega a miséria com o desprezo. Lá, a pobreza vexa mais a alma do que fere o corpo. O homem e a mulher do Douro têm uma qualidade, que é não serem caninos, não se inclinarem às côdeas que vêem o patrão comer. Nos seus olhos e na sua carne, há a imunização à carreira do que sobe na vida e é promovido. Ainda há pouco tempo, o homem do Douro nascia na vinha e morria no saibramento.No Porto, grande parte da sua gente, se não fosse o sangue inglês que lhe dá um perfil marítimo, era feia como trovões. O mesmo acontece no Douro. Miguel Torga localizou na estação de caminho de ferro da Régua a pátria resumida da fealdade. Pois será. A beleza é uma questão de densidade atmosférica e de equilíbrio entre a razão e o gesto. A máscara corresponde ao rito. Pois será."
Agustina Bessa-Luís, As Pessoas Felizes, 2ª edição, Lisboa: Guimarães Editores, 2006, pp. 178-179.
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