Tuesday, December 31, 2013

NA DIVINA HORA DE NADA ESPERAR



"Quando a lua se envolve em túnica ligeira
E um alado segredo no ar fragrante ondeia, 
De Artemisa é a noite virgem e alta. Suave. 
Serenamente cheia de intacta novidade. 

No tempo isento escorre o sentimento casto
De terra e céu fundidos num delírio ermo e vasto, 
Sob um pudor de estrelas que tremem se as olhamos, 
Cai uma folha e fremem delicados os ramos. 

Alta e branca Artemisa entra no mar e desata 
A trança. Boiam na água seus cabelos de prata:
E a sombra num odor branco por jasmins a brotar
Escorre para os brilhos silenciosos do mar. 

Sem peso os pensamentos seguem inefáveis cursos
Que a brisa traz de um bosque interdito aos impuros. 
De leve quer voar a noite e só suspende
O seu voo uma haste de avencas que a prende. 

Alvo silêncio a lua impõe à treva e airosas
Nesse halo dançam fadas encantadas em rosas;
E tudo docemente vai para os termos divinos
De uma paz final. Sonho? Ou sonhada me sinto?

Ecoam no infinito cristais e nesse acorde
Minha alma é uma virgem prometida ao licorne. 
Ó sozinha e divina hora de nada esperar!
Apenas caem pérolas diáfanas do luar."


Natália Correia, Antologia Poética, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2002, pp.224-225.

No comments: