Thursday, December 5, 2013

TRISTITIA



"Minh'alma é triste como a rola aflita
Que o bosque acorda desde o alvor da aurora
E em doce arrulo que o soluço imita
O morto esposo gemedora chora. 

E, como a rola que perdeu o esposo,
Minh'alma chora as ilusões perdidas. 
E no seu livro de fanado gozo
Relê as folhas que já foram lidas. 

E como notas de chorosa endecha
Seu pobre canto com a dor desmaia, 
E seus gemidos são iguais à queixa
Que a vaga solta quando beija a praia. 

Como a criança que banhada em prantos
Procura o brinco que levou-lhe o rio, 
Minh'alma quer ressuscitar os cantos
Um só dos lírios que murchou o estio. 

Dizem que há gozos nas mundanas galas, 
Mas eu não sei em que o prazer consiste. 
- Ou só no campo, ou no rumor das salas, 
Não sei porquê - mas a minh'alma é triste!"


Casimiro de Abreu, As Primaveras, Porto: Lello & Irmão, 1945, pp. 121-122 [ort. at.]. 

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