"Nos sentidos humanos, e em grau supremo na visão, encontramos os herdeiros naturais daquela duplicidade. Efectivamente, os nossos sentidos, a que os Estóicos chamavam anjos, são os nossos mensageiros, estão sempre a caminho de, no intervalo inapagável entre este lado e o outro. Desde cedo que a curiosidade humana submeteu a inquérito esses intermediários e criou dispositivos que reduplicavam os seus enigmas, sendo a invenção do espelho um dos mais férteis. Tensão equivalente que se demora entre o ecrã e aquilo que o ecrã esconde e deixa ver, deixa projectar, também aí o tempo espia e espera pelo seu detonador, o medo. Variação sobre o tema do espelho, o ecrã é uma das apresentações modernas da ambiguidade angélica do olhar."
Maria Filomena Molder, Rebuçados Venezianos, Lisboa: Relógio D'Água, 2016, p. 108.
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