Wednesday, July 30, 2025

AO FUNDO

 


"sentei-me ao fundo. 
não rezei. 
não pedi nada. 
só quis estar ali. 
num sítio onde a tortura subisse ao teto e o lavasse

não chorei.
mas doeu-me o corpo todo.
e naquele banco frio
senti que o meu filho,  mesmo sem saber, 
me tinha salvado outra vez

e isso bastava para me manter vivo mais uma noite.
mesmo com o medo de não ter comprado
com a própria dignidade
o direito de nos amarmos em liberdade"


Rui Sobral, Noturnos, Lisboa: Poética Edições, 2025, p. 108. 

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