" - Não sei, Louise. A minha opinião sobre os homens de hoje decresceu muito. Mas consigo viver, apesar disso.
- Não, Mãe. Parece que estamos a viver de combustível antigo, como o camelo que se alimenta da sua bossa. A vida não corre para dentro de nós, como sucede até com St. Mawr, que é um animal dependente. Eu não consigo viver, Mãe. Não consigo.
- Não sei porquê. Eu estou cheia de vida.
- Eu sei que está, Mãe. Mas eu não estou, e sou sua filha. - E não me entenda mal, Mãe. Eu não quero ser um animal, como um cavalo, uma gata ou uma leoa, embora eles me fascinem pela maneira como recebem a vida directamente, sem ser através de uma série de velhos reservatórios, como nós. Não admiro o homem das cavernas, nem coisa desse género. Mas pense, Mãe, se nós conseguíssemos receber a nossa vida directamente da fonte, como os animais, e continuar a ser nós próprios... a Mãe também não aprecia os homens. Mas não faz ideia de como os homens me fatigam: até o simples acto de pensar neles. A Mãe diz que eles são excessivamente animalescos. Mas não são, Mãe. O animal dentro deles tornou-se perverso, ou tímido, ou submisso, ou domesticado, como os cães. Não conheço um único homem que seja um animal orgulhosamente vivo. Sei que deixaram de pensar verdadeiramente. Mas os homens deixam sempre de pensar verdadeiramente quando morre neles o último vestígio do animal selvagem.
- Porque temos mentes...
- Deixamos de ter mentes logo que ficamos domesticados, Mãe. Os homens são todos mulheres, a tricotar e a fazer crochet com as palavras.
- Não posso concordar inteiramente consigo, Louise."
D. H. Lawrence, "St. Mawr", in St. Mawr e outros contos, trad. Clarisse Tavares, Lisboa: Livros do Brasil, 1990, pp. 84-85.

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