"As estrelas do meu tempo eram mais brilhantes,
mais numerosas, o céu era mais negro,
e o silêncio de tanta vida era mais belo
suspenso o mar por cima em gotas flutuantes.
Ainda hoje o céu se despenha no silêncio,
o fino silêncio das cintilações,
como é possível suster no olhar um peso assim,
as cascatas do céu a despejarem-se nos olhos
mais silenciosamente que o voo dum pirilampo?...
É o silêncio do céu que tomba sobre mim,
o infinito percorre-me como um toque de trombeta,
conheço todas estas estrelas uma a uma
como o senti ao entendê-las pela primeira vez.
E depois de eu ter morrido elas continuarão a brilhar
e depois de a Terra ter morrido
e depois de elas próprias terem morrido
e de se terem de novo fabricado.
E também este silêncio do meu olhar
alimentado pela taça do céu
atravessa-me e deixa-me a vibrar,
nada mais quero senão compreender
o logaritmo que me transmite a passagem,
saber que morro só, que vivo só,
tão cheio de silêncio como de nada."
Jorge Guimarães, Odes Nocturnas, Lisboa: Guimarães Editores, 1990, pp. 11-12.
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