"Esta ideia, de que o «Francisco» poderia vir a falar, divertiu muito a jovem. Lourenço olhou para os grandes olhos verdes do bicho e sentiu um estremecimento percorrer-lhe a pele.
- Aqui tens como ele faria - continuou Teresa -: pôr-se-ia de pé, e, apontando para mim com uma pata, e para ti com a outra, exclamaria: «O senhor e a senhora beijam-se a valer no quarto; e não têm medo de mim, mas como os seus amores criminosos me desagradam, peço-lhe que os mande prender aos dois; não voltarão a perturbar a minha sesta.»
Teresa brincava como uma criança, mimava os modos do gato, estendia as mãos, como se fossem garras, imprimia aos ombros ondulações felinas. «Francisco», sempre numa imobilidade de pedra, continuava a olhar para ela; só os seus olhos pareciam vivos; e tinha, aos cantos do focinho, duas pregas profundas, dir-se-ia que aquela cabeça de animal empalhado ria às gargalhadas."
Émile Zola, Teresa Raquin, trad. João Gaspar Simões, Lisboa: Círculo de Leitores, s.d., p. 59.
No comments:
Post a Comment